quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Plebiscito Constituinte: de quem é o interesse de tirar o poder do povo?

por SANDRO CHAVES ROSSI*


Em junho de 2013 várias pessoas foram às ruas protestar contra o aumento da tarifa do transporte público. O movimento ganhou força e se expandiu não só em número de participantes, mas também em número de pautas. Há quem diga que o movimento foi despolitizado, mas talvez não: o que foi visto foi um movimento heterogêneo composto desde partidos de esquerda que sempre usaram as ruas para protestar até uma massa despolitizada com petições vazias. Mas o que todos eles tinham em comum? Ninguém mais se sentia representado.

Cerca de cinco meses depois do começo das manifestações, aconteceu a 1ª Plenária Nacional da campanha pelo Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. A plenária contou com a participação de diversos movimentos sociais, entidades sindicais, partidos políticos e militantes das mais variadas vertentes. Houve mais uma segunda Plenária Nacional que teve o intuito de organizar a votação para o plebiscito, que aconteceu do dia 1 ao dia 7 de Setembro. O plebiscito contava com uma única pergunta: “Você é a favor de uma constituinte exclusiva e soberana sobre o sistema político?” 7.754.436 milhões de pessoas votaram e 97% delas se disseram favoráveis à constituinte. Esse resultado foi entregue aos três poderes da República nos dias 13 e 14 de Outubro. 

Toda essa mobilização não tem caráter legal e tem mais como objetivo mostrar o desejo popular por mudanças no sistema político brasileiro. Não houve notícias na grande mídia sobre o plebiscito, o que de fato é intrigante, pois além dos apoios já citados anteriormente, a maioria dos presidenciáveis das eleições se mostrou favorável ao plebiscito. Inclusive alguns deles votaram, como Marina Silva (PSB), Luciana Genro (PSOL), Eduardo Jorge (PV) e Pastor Everaldo (PSC). A presidenta reeleita Dilma Rousseff (PT) declarou apoio às reivindicações, porém não votou, alegando que não poderia votar por ser chefe de estado. 

A questão só começou a ganhar força na mídia quando Dilma mostrou a vontade de fazer uma reforma política através do plebiscito e sofreu inúmeras críticas por isso. Houve críticas construtivas por parte de vários juristas e professores universitários sobre o jeito que a reforma devia ser feita. Alguns sugeriram até mesmo substituir o plebiscito por um referendo, que consiste em o Congresso fazer a reforma política e depois o povo votar se é a favor ou não. Porém houve muitas críticas infundadas que mostraram um certo desespero por parte de alguns. 

A principal crítica partiu do ministro do STF Gilmar Mendes, que posicionou-se absolutamente contrário à convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva para Reforma Política, quando esta foi proposta pela presidência. O ministro utilizou o adjetivo “bolivariano” para justificar sua crítica, posicionamento que esperaríamos ver vindo do Lobão ou de qualquer outro colunista da Veja, e não de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Não é à toa que até mesmo seus companheiros de corte se surpreenderam com a sua declaração. Mas por que o plebiscito incomoda tanto? O que tem de mais na reforma política? 


Não é assustador ver o Lobão de toga? 

Uma das principais pautas da reforma política é o fim das doações de empresas privadas para partidos políticos e candidatos, pois o sistema de financiamento privado cria desigualdades no processo eleitoral e afasta os que não têm como buscar recursos para campanhas. Isso transforma as desigualdades econômicas em desigualdades políticas, interferindo negativamente na democracia. Além do mais, o financiamento privado das campanhas eleitorais exige a sua contrapartida: os parlamentares passam a defender os interesses dos seus financiadores e dos grupos aos quais são vinculados. Segundo o DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), dos 594 parlamentares (513 da Câmara e 81 do Senado) eleitos em 2010, 273 eram empresários; 160 compunham a bancada ruralista; 66 eram da banca evangélica; e apenas 91 se definiam como representantes dos trabalhadores. Um descontentamento com essa pauta da reforma política foi bem notória por parte de alguns políticos, sendo o principal deles o senador e ex-presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG), que chegou ao ponto de dizer que desaprovava o “ativismo político” dos ministros do STF por serem de maioria favorável à inconstitucionalidade das doações de empresas. 

Outra pauta que está dando dor de cabeça para muitos é a reforma eleitoral, que visa acabar com os “puxadores de votos” ou como alguns dizem, o “efeito Tiririca”: quando um candidato é eleito e, pela quantidade grande de votos, acaba levando outros candidatos da coligação. Um levantamento do DIAP mostrou que em 2010 apenas 35 dos 513 deputados federais foram eleitos somente com seus próprios votos. Existem várias propostas de reforma eleitoral. A OAB apresentou o modelo de “voto distrital”. nesse tipo de votação, o Estado seria dividido em vários distritos, e cada distrito elegeria um deputado por maioria simples (50% dos votos mais um). O MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) propõe um aperfeiçoamento desse modelo, em que, no primeiro turno, os eleitores votariam apenas nos partidos, obrigando o eleitor a escolher entre propostas ou plataformas políticas. Depois de definido o número de vagas de cada partido, o eleitor votaria, no segundo turno, no candidato de sua escolha. A reforma política ainda conta como uma das suas principais pautas o fim do voto secreto no Congresso e o fim da reeleição para presidência da república. 

Em 2010, Tiririca recebeu mais de um milhão de votos e levou mais três candidatos para o Congresso 



A reforma política propõe uma mudança profunda no sistema político brasileiro a fim de torná-lo mais justo e democrático, e consequentemente dar mais representatividade ao povo. Não é à toa que há uma grande resistência por parte das forças mais conservadoras do meio político em dar mais autonomia para o povo através de um plebiscito, pois a garantia de seus interesses próprios está em xeque. Tem que ser muito mal informado ou muito mal intencionado para ser contra a reforma. Quem é contra a reforma política é contra o povo, e quem é contra o povo não nos representa.


* Sandro Chaves Rossi tem 22 anos e é acadêmico de Engenharia Elétrica da Universidade Tecnológica Federal do Paraná

Nenhum comentário:

Postar um comentário