quarta-feira, 20 de maio de 2015

Você devia se indignar com o Bolsa Banqueiro, isso sim!

por SANDRO CHAVES ROSSI



Políticas públicas são necessárias para reduzir a desigualdade social em um país. Tais políticas são feitas por vários governos no mundo inteiro e já se mostraram (e ainda se mostram) extremamente eficazes. O grande problema é que há muitas críticas em cima de tais políticas. Aqui no Brasil temos o grande exemplo do Bolsa Família, que é chamado de política populista ou até mesmo acusado de incentivar a "vagabundagem" (sic). E se eu te falar que o governo gasta muito mais com o "Bolsa Banqueiro"? Que inúmeros programas sociais poderiam ser criados e até otimizados com esse dinheiro gasto? Que nós pagamos uma dívida que nunca diminui? 



O termo “Bolsa Banqueiro” foi amplamente utilizado por Plínio de Arruda Sampaio, candidato do PSOL à Presidência da República em 2010. O Bolsa Banqueiro é o pagamento do serviço da dívida pública (juros, amortizações e encargos). O montante envolvido é obtido via tributação, através dos assalariados e consumidores, e transferido através do “sistema da dívida” para um pequeno e seleto grupo de privilegiados, no caso, os bancos.

Como surgiu o Bolsa Banqueiro?

Surgiu através da dívida pública. Basicamente, o governo empresta dinheiro dos bancos com juros altíssimos e depois sofre para pagar essa dívida. Se não fossem os juros, a dívida já estaria paga - ou pelo menos grande parte dela. O juro é o lucro de uma instituição financeira. A dívida não era tão grande, ela começou a se agravar no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) devido às políticas de privatização, apesar do dinheiro embolsado com a venda das empresas estatais, a dívida pública aumentou exponencialmente. Isso aconteceu porque o Estado deixou de gerar riquezas com as privatizações, tendo como principal fonte de renda apenas a arrecadação de impostos, ou seja, as dívidas continuaram e a receita diminui. No período de governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) o lucro dos bancos foi algo em torno de R$ 64 bilhões.

Como é a situação hoje?

Quando o PT era oposição no governo do PSDB, um dos seus maiores discursos contra a situação era o lucro dos bancos com a dívida pública, porém, quando o PT chegou no poder, a situação piorou. No período do governo Lula (2003-2010), o lucro dos bancos foi de R$ 254,7 bilhões, valor quase 4 vezes maior que o deixado por Fernando Henrique Cardoso. A situação piorou de vez no governo de Dilma Rousseff, tendo seu ápice em 2012, quando o lucro das instituições financeiras foi de R$ 115,75 bilhões - em apenas 3 anos de governo (2011-2013) -, tudo isso somado a um terrível dado: os brasileiros pagaram R$ 753 bilhões em juros da dívida pública em 2012. Para se ter noção dessa quantidade de dinheiro, é 10 vezes o valor gasto em saúde e 13 vezes o valor gasto em educação em 2012. Em 2014, a dívida pública chegou em R$ 1 trilhão.

O que podemos fazer para pagar essa dívida?

Desde a Constituição de 1988 está determinada uma auditoria da dívida, ou seja, uma votação para determinar se devemos ou não pagar esse montante, porém até agora ninguém recorreu a essa ação.

Mas não é errado deixar de pagar uma dívida que o próprio governo fez?

Claro que sim, porém existem muitas irregularidades nessa dívida e que, se forem analisadas com mais cautela, diminuirão bastante o valor a ser pago. A CPI da Dívida mostrou que o TCU (Tribunal de Contas da União) não analisa a dívida com um todo, mas apenas faz estudos pontuais sobre aspectos muito específicos. A CPI identificou sérios e vários indícios de ilegalidades do endividamento externo e interno, tais como:

– Boa parte da dívida atual decorre da obscura e questionável dívida da ditadura (ou seja, um governo ilegítimo), com clausulas ilegais e sem documentação;
– Utilização de juros flutuantes, ilegais segundo o Direito Internacional;
– a aplicação de juros sobre juros (“anatocismo”, vedado pela Súmula 121 do STF);
– o pagamento antecipado de parcelas da dívida externa com ágio de até 70%;
– a realização, pelo Banco Central, de reuniões trimestrais com representantes de bancos e outros rentistas, para a estimar variáveis como juros e inflação, que depois são utilizadas pelo COPOM (Comitê de Política Monetária) para a definição das taxas de juros (ou seja, é “colocar a raposa para tomar conta do galinheiro”);
– Ausência de contratos e documentos; ausência de conciliação de cifras;
– A grande destinação dos recursos orçamentários para o pagamento da dívida viola os direitos humanos e sociais.

O governo não vai sofrer represálias do mercado financeiro caso isso aconteça?

Pode ter certeza que sim, porém muitos economistas dizem que não entraríamos em um colapso financeiro como alguns dizem, pois o Brasil é um dos países que mais recebem investimentos no mundo inteiro e tem um caráter bastante produtivista. Além do mais, os bancos também têm dívidas com o governo, como por exemplo o Itaú, que deve aos cofres públicos R$ 18,7 bilhões de impostos atrasados. Também vale lembrar de escândalos de corrupção e que devem gerar uma dívida dos bancos com o governo, como o Bradesco e o Santander, que estão envolvidos na Operação Zelotes - operação realizada por diversos órgãos federais contra um esquema que causava o sumiço de débitos tributários, uma forma de desfalcar os cofres públicos.



Enquanto as pessoas ainda se indignam com o Bolsa Família, que é um programa que tirou milhões de pessoas da pobreza extrema e que custa apenas 0,8% do PIB para os cofres públicos, os bancos estão batendo recordes de lucro em cima de uma dívida que já era para estar paga e que está cheia de irregularidades, juros estão sendo pagos ao invés de se investir em políticas públicas. Vale lembrar que estamos em ano de instabilidade econômica e que os ajustes fiscais do governo vão pesar em cima da classe trabalhadora e não em cima de quem deveria pagar por grande parte dessa crise. E você? Vai continuar se indignando só com quem recebe um pouco mais de R$ 100 por mês para sobreviver ou com quem está causando rombos enormes nos cofres públicos, sem produzir nada e ainda encurtando seu dinheiro com ajustes fiscais que deveriam ser feitos para eles mesmos?

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