quinta-feira, 14 de maio de 2015

Getúlio Vargas. Um mito político construído

por JESSICA LEME


A história política durante muitos anos foi a protagonista dos projetos de pesquisa e publicações, geralmente pautadas na construção de histórias nacionais, narrativas sobre sistemas de governo, revoluções, etc. Com o passar do tempo à história política caiu em descrédito ou em desuso, sendo deixada de lado por outros campos de pesquisa. O historiador político deveria então passar a se preocupar não somente com a instituição política, mas também o poder que lhe é inerente. O estudo do poder que a política detém sobre as sociedades seria a partir de então um novo objeto de estudo, visto que a política perpassa até mesmo os laços afetivos, como se vê claramente durante campanhas eleitorais. 

Grande parte das críticas lançadas à produção da história política tinha como ponto principal o fato de ser percebida como elitista, de enaltecer determinados sujeitos, sua superficialidade de análise. 

A história política, com sua tradição de criar heróis, legitimar governos e regimes de Estado, acabou permanecendo a mesma após as diversas revoluções que passaram a percorrer governos pelo mundo, derrubando principalmente monarquias. A persistência em criar protagonistas apagou a real importância das minorias, das massas, dos anônimos, dos heróis esquecidos que estiveram à frente de tantas mudanças políticas. Essa parcela da história só seria resgatada mais recentemente com as novas formas de abordagem da nova história cultural. 

A representatividade de Getúlio Vargas na memória coletiva do Brasil teve suas raízes num processo político de culto da sua figura, na legitimação de locais/lugares/objetos que tenham feito parte de algum momento auspicioso de sua trajetória ou até mesmo seu discurso e herança política.O governo Vargas caracterizou a introdução do que chamamos de cultura de massa no Brasil, esta por sua vez trouxe uma nova forma de cultura política. Após a crise do liberalismo muitos países buscaram rever a figura do Estado para conter a crise social, buscando líderes carismáticos que conduziriam às massas a fim de evitar revoluções populares. 

Nesse modelo de governo que se estabeleceu a manipulação ideológica era uma forte tendência, aproveitando se da população em sua grande maioria ainda proveniente da zona rural, sem qualquer cultura política anterior, portanto facilmente manipulável. 

O uso da fotografia no regime Vargas era utilizado principalmente com o intuito propagandístico, no Brasil a fotografia foi mais utilizada que demais formas de propaganda por ter referência à ideia de realidade, o que pode demonstrar o caráter positivista da sociedade brasileira, assim como o da formação própria de Getúlio Vargas. 

A fotografia se organiza em dois segmentos, aquele o qual algo é expresso (papel, cores, tecnologia utilizada) e também seu conteúdo (aquilo que está fotografado, pessoas, objetos, lugares). A análise fotográfica tem na sua noção de temporalidade a chave para sua interpretação, visto que cada situação fotografada corresponde a determinado momento histórico. A foto nada mais é que um recorte desse tempo/espaço. 

A fotografia carrega consigo uma realidade própria, ela não necessariamente está ligada ao fato ou assunto que representa. Essa realidade é criada, e não de forma ingênua, neutra ou imparcial. 

A fotografia é considerada um produto cultural, visto que é um elemento social e dentro dessa perspectiva ela pode lançar novas formas de comportamento, moda, assim como também podem servir como elemento de controle das massas. Este aspecto foi extremamente utilizado durante o governo Vargas para a construção e legitimação do governo autoritário. Diversas formas de propaganda utilizando fotografias do então presidente foram produzidas pelo Departamento de Imprensa e Propaganda criado na época especialmente para estes fins. 

Na política a imaginação se faz presente no que diz respeito a determinado indivíduo, ou seja, o que o faz ser lembrado? Algo que o enaltece ou o diminui perante a sociedade. 

Quando se produz um sistema que reproduz e legitima a ordem estabelecida também surgem sistemas que guardam estes símbolos e representações. Com a possível dominação e manipulação pelo poder político, a história do imaginário social começa a se aproximar também da história da propaganda. 

As ideologias nascem das representações que determinada sociedade tem de si própria e das relações que ela tem com as sociedades antagônicas ao seu modelo. É através disso que as sociedades exprimem suas aspirações, justificam suas ações e moldam seu futuro. Internamente, a dominação da classe dominante passa necessariamente pelo campo ideológico. O discurso da mesma é veiculado à grande massa pelo Estado, Igreja, escola, e porque não do domínio da propaganda e dos veículos de informação. 

O imaginário social é uma força reguladora da vida coletiva. Os símbolos não somente indicam a qual sociedade o indivíduo pertence, mas também servem como uma alternativa muito eficaz de controle da vida coletiva, principalmente no exercício do poder. O imaginário tem o sentido unificador extremamente forte, que lhe é dado pelo misto de verdade, normatividade, informações e valores que se colocam através dos símbolos. O imaginário social não funciona de forma isolada; ele usa de várias fontes simbólicas do coletivo e em boa parte usa da simbologia sagrada para legitimar seu poder. 

O sistema de criação dos imaginários redunda na formação do carisma do chefe, conferindo-lhe um status de grande guia com poderes por vezes sobre humanos, encarnando o mito político que protege e salva uma coletividade. O mito político é uma fabulação, é a criação de algo que foge ao real, porém, o mesmo mostra uma fração daquele dado momento. 

O mito político surge a partir de uma deformação da realidade, havendo uma negação daquilo que realmente existe. Também deve se levar em consideração que mesmo sendo um mito ele nos traz características da sociedade de seu tempo.

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