quinta-feira, 7 de maio de 2015

Pátria Deseducadora

O documento Pátria educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional e a implementação da "ética de mercado" na educação

por OSVALDO RODRIGUES JUNIOR 




Na cerimônia de posse, ainda no dia 1º de janeiro, Dilma Rousseff anunciou o lema do novo governo, "Pátria educadora", indicando como prioridade a educação nos próximos 4 anos. No discurso, a presidente enfatizou que "ao bradarmos ‘Brasil, pátria educadora’ estamos dizendo que a educação será a prioridade das prioridades, mas também que devemos buscar, em todas as ações do governo, um sentido formador, uma prática cidadã, um compromisso de ética e sentimento republicano”. 

Após este anúncio, ocorreu um corte de 31% das verbas no Ministério da Educação. Cid Gomes, então Ministro da Educação pediu exoneração ao se desentender com os parlamentares no Congresso Nacional e Renato Janine Ribeiro assumiu o MEC. Dentre as mudanças, o mote "Pátria Educadora" não foi esquecido na posse do novo ministro. 

Dando materialidade ao slogan, no último dia 22 de abril a Secretaria de Assuntos Estratégicos lançou o documento Pátria educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional. O documento é dividido em duas partes: a primeira, que trata da tarefa descrevendo a realidade educacional brasileira e o "ideário do projeto"; e a segunda, que trata das iniciativas ou as propostas de ação, é apresentado como proposta preliminar para discussão. 

Uma leitura rápida do documento permite observar os problemas e lacunas presentes no projeto. A primeira, e a mais grave delas, é a não referência a uma pesquisa acadêmica sequer sobre a educação brasileira, o máximo que se faz são citar experiências "bem sucedidas" na Austrália e na Inglaterra. O segundo, e também grave, é o uso de uma retórica vazia e coberta de pré-conceitos em relação à escola, ao professor, aos diretores aos demais agentes da educação. 

Na tarefa indica-se que o Brasil avançou na democratização do acesso à educação, mas que a qualidade do ensino no país é o grande problema. Para mudar esta realidade, o texto propõe a construção de um "ideário nacional" que oriente a transformação e indica que "ninguém faz revolução com mentalidade ou método de tecnocrata". 

Na contextualização do projeto, o documento apresenta que o Brasil passou por um período de desenvolvimento econômico que permitiu o acesso a bens de consumo, porém não a bens culturais. Para alterar este quadro, a proposta indica alguns passos iniciais. O primeiro seria "aproveitar o exemplo que deu certo". Tônica de vários pontos do texto parece remeter às "escolas-modelo", que no final do século XIX serviam de referência para as demais instituições educacionais no país. 

No ponto "mudar a maneira de ensinar e aprender" o documento explicita o ensino enciclopedista e raso como um problema para o país, propondo um ensino que capacite analiticamente os agentes sociais. Por fim, ainda nos passos iniciais, propõe a organização da diversidade existente no país. 

Nos eixos de qualificação do ensino público são apresentados os elementos propostos: Construir o federalismo cooperativo no ensino básico, mudar o paradigma curricular e pedagógico do ensino básico, diretores e professores, tecnologias e técnicas. No primeiro item, não se propõe a federalização, mas a constituição de órgãos confederados que permitam um melhor diálogo entre União, Estados e municípios na gestão da Educação Pública. Como parâmetro, é citado o Sistema Único de Saúde - SUS. 

Nos demais itens aparecem a ideia de construção de uma base curricular nacional comum em substituição aos Parâmetros Curriculares Nacionais, que seria levada aos professores por meio de protocolos. Além disso, concepções estereotipadas de diretores e professores e a velha máxima de que “o aumento salarial do professor, por si só, não gera a melhoria do ensino”, fala constantemente utilizada para justificar os péssimos salários recebidos pela categoria, que, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, recebe um dos piores salários dentre os países pesquisados, estando à frente apenas da Indonésia. 

Ranking salarial de professores da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE


Nos dois últimos itens são apresentadas ideias ainda mais complicadas, como a de necessidade de constituição de uma “vanguarda pedagógica”, que seria responsável por disseminar a transformação, e a de conceituar a proposta enquanto obra de “libertação nacional”. 

Na parte II, Iniciativas, salta aos olhos a proposta de criação de uma carreira nacional comum para os docentes, como se isso fosse possível em uma país federalista; e finalmente a “neoliberalização” definitiva da Educação com a instituição dos contestados “bônus salariais” por desempenho aos professores e diretores. O texto indica o seguinte: “A premiação pelo alcance de metas de desempenho será para toda a escola. Os diretores receberão também prêmio salarial, de uma só vez no final do ano letivo, mas sempre no contexto da premiação maior para a escola como um todo”. 

A política de “bônus”, já fracassada em São Paulo, impossibilita a discussão de uma carreira docente que incentive a adesão e a permanência, ao mesmo tempo em que introduz uma meritocracia pouco meritocrática, tendo em vista os diferentes contextos escolares vividos pelos professores brasileiros. 

Por tudo isso, a proposta “Pátria educadora” vai se constituindo como uma figura de retórica de Dilma Rousseff e evidencia de uma vez por todas a guinada à direita do governo do Partido dos Trabalhadores – PT. 

Abraços, 
Osvaldo. 

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