quinta-feira, 17 de julho de 2014

O "Viralatismo" e os usos políticos da Copa do Mundo

por OSVALDO RODRIGUES JUNIOR

Antes de iniciada a Copa do Mundo do Brasil no dia 12 de junho de 2014, a grande imprensa, personalidades públicas e partidos de oposição previam uma “tragédia” organizacional. A alardeada tragédia pode ser explicada por dois elementos: o complexo de vira-lata, que prima pela inferioridade brasileira em relação às nações "desenvolvidas" disseminado pela grande imprensa e pela intelectualidade colonizada; e os usos políticos do evento buscando relacionar o “fracasso” a incapacidade gerencial do governo. 

Em 1958, Nelson Rodrigues publicou na revista Manchete Esportiva o texto, "Complexo de vira-lata". Comentando a participação da seleção brasileira na Copa do Mundo da Suécia de 1958, o dramaturgo e escritor revisitou a derrota para o Uruguai na Copa do Mundo de 1950 para explicar a "descrença" em relação a seleção. Neste texto, Nelson Rodrigues cunhou o termo "complexo de vira-latas". Nas palavras do próprio “por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo". 

Este "complexo de vira-latas" explica em partes as previsões trágicas sobre a Copa do Mundo do Brasil. A imprensa previu caos aéreo, falta de energia, manifestações violentas, assaltos e "arrastões" em massa e atraso na construção dos estádios. Em relação à infraestrutura destaco como exemplos do "viralatismo" o movimento "#blackoutnacopa" e a Revista Veja. O primeiro apostava na fragilidade do sistema elétrico brasileiro e sugeria que ao iniciar o hino nacional brasileiro na partida de abertura, todos deveriam ligar todos os eletrodomésticos, inclusive os chuveiros, para causar um enorme blackout no país. O segundo, em matéria assinada por Reinaldo Azevedo, indicava que os estádios da Copa do Mundo só ficariam prontos em 2038

 


Além deles, personalidades públicas embaladas pelo bordão "imagina na Copa" fizeram as suas previsões para a Copa do Mundo do Brasil. O jornal O Globo convidou dez artistas para escrever crônicas com as previsões pessoais sobre a Copa do Mundo. Dentre os dez, apenas dois fizeram previsões menos pessimistas com doses de humor. O escritor Paulo Coelho afirmou em entrevista à revista Época que "a barra iria pesar" durante a Copa do Mundo. Além deles, Arnaldo Jabor afirmou, no dia 06 de junho na Rádio CBN, que “nós estamos jogando fora a imensa sorte que temos, por causa de dogmas vergonhosos que não existem mais. Estamos antes do Muro de Berlim e a Copa do Mundo vai revelar ao mundo a nossa incompetência”. 

Fazendo uso político das previsões “pessimistas”, partidos oposicionistas atacaram a realização da Copa do Mundo buscando relacionar este evento a falta de capacidade administrativa do governo de Dilma Rousseff. O site oficial do Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB - reafirmou a previsão de caos aéreo. O senador tucano Álvaro Dias chegou a sugerir que o governo brasileiro se desculpasse com a Federação Internacional de Futebol – FIFA - e desistisse de realizar o evento. Dias reforçou ainda a ideia de prejuízo econômico acompanhado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que reiterou “a Copa do Mundo como símbolo de desperdício”

A Copa do Mundo veio e com ela as previsões “catastróficas” foram caindo por terra, uma a uma. Excetuando a composição de um aparato repressivo-militar, do uso de força excessiva para dispersar as poucas e localizadas manifestações durante o evento e da prisão, no mínimo arbitrária, dos manifestantes Fabio Hideki Harano, Rafael Marques Lusvarghi e da professora de Filosofia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Camila Jourdan, que ocorreram no contexto da Copa do Mundo, porém sob responsabilidades das polícias militares submetidas ao poder dos estados, podemos considerar a Copa do Mundo um evento bem sucedido quanto a sua organização. 

Jornais como o The New York Times, Le Monde e The Guardian ainda em junho destacavam que as previsões pessimistas estavam erradas. Dàvid Ranc, PHD em estudos esportivos pela Universidade de Cambridge e professor de uma escola de negócios francesa (ESSCA) afirmou que a Copa do Mundo no Brasil foi melhor organizada que as Olimpíadas de Londres em 2012. O caos aéreo não veio, pelo contrário, vieram elogios de jornalistas e turistas pela eficiência dos aeroportos e do sistema de transporte aéreo do país. A falta de energia e os assaltos e “arrastões” em massa também não aconteceram. Além disso, para tristeza de Reinaldo Azevedo todos os estádios ficaram prontos no prazo e a Copa rolou normalmente. Por fim, após a Copa do Mundo, 93% dos turistas afirmaram que pretendem voltar ao país. 

Em meio a verdadeiros testemunhos de imparcialidade e incapacidade de informar, a imprensa brasileira foi mudando o discurso para não negar o óbvio, a Copa foi um sucesso de organização. A Revista Época, das organizações Globo, foi de uma capa que continha a imagem de uma tartaruga de chapéu com a manchete “Porque tudo atrasa no Brasil” a outra com o brasão da Confederação Brasileira de Futebol - CBF - e a manchete “Eu acredito!”. 




Com o sucesso, os partidos oposicionistas passaram a denunciar o uso político da Copa do Mundo pela presidenta Dilma Rousseff. O slogan “#Copadascopas” utilizado pela presidenta e por membros do alto escalão do governo se espalhou de maneira viral. Aécio Neves, presidenciável pelo PSDB, criticou o uso político da Copa pela situação afirmando que o Brasil não precisa de uma “futebrás” e que a presidente se comportou como “artilheira da seleção”. 

Com a acachapante derrota da seleção brasileira para a Alemanha por 7x1 nas semifinais que deixou escancarada a necessidade de reforma do futebol brasileiro, o discurso mudou. Pegando carona no insucesso da seleção brasileira, os oposicionistas buscaram e continuam buscando, relacionar a derrota da seleção brasileira em campo ao governo Dilma Roussef. Aécio Neves que havia afirmado que “Copa do Mundo é uma coisa, eleição é outra” juntamente com Xico Graziano, chefe da área de informática da sua campanha, utilizou a derrota da seleção brasileira para fomentar a necessidade de mudança do país. 







A Copa do Mundo serviu, mais uma vez, para escancarar o “viralatismo” da imprensa e da intelectualidade colonizada. Mas mais do que isso, serviu para constatar a ausência de propostas e projetos de efetiva mudança, representadas pelas previsões e críticas oportunistas. 


Abraços, 
Osvaldo.  

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