segunda-feira, 7 de julho de 2014

O Verdadeiro Legado da Copa

Já começou faz tempo o show de horrores que relaciona um eventual insucesso da Copa do Mundo, dentro e fora de campo, ao desempenho técnico e político de Dilma Rousseff como chefe de Estado. Já temos um verdadeiro legado e ele é catastrófico 

por MURILO CLETO



Uma imagem parece definir com precisão o que se tornou o cenário político do país desde o momento em que a Copa do Mundo passou a ocupar a pauta central de uma oposição carente de pautas sólidas que fundamentassem a criação de um projeto político para o Brasil que caminha para a terceira reeleição do PT no governo federal. Atingido com uma joelhada nas costas, Neymar mais uma vez virou o centro das atenções para estampar infinitas manifestações acaloradas de brasileiros. Houve quem ameaçou o zagueiro colombiano Juan Zúñiga através de redes sociais, quem comemorou a contusão do craque da seleção e, claro, quem usou todo o aparato médico dedicado ao jovem para reforçar a péssima qualidade dos serviços públicos de saúde na terra onde se sedia o maior torneio esportivo do mundo.

Com recursos do governo federal, através do Plano Nacional de Mobilidade Urbana, a prefeitura de Belo Horizonte contratou a empresa Delta para a construção do viaduto que passava sobre a Avenida Pedro I. A obra atrasou, não foi entregue até o início do torneio, chegou a ser interditada e passa por investigações do Ministério Público e do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais com indícios de superfaturamento. Na última quinta-feira, um dia antes da contusão de Neymar, a construção simplesmente desabou. Culpa de quem? No dia seguinte, os três principais jornais do país estampam as seguintes manchetes:

Folha de S. Paulo: "Obra inacabada da Copa desaba e mata 1 em BH"
O Estado de S. Paulo: "Viaduto planejado para Copa cai e mata 2"
O Globo: "Viaduto de obra da Copa desaba e mata 2 em BH"



Existe, de fato, um grande legado da Copa do Mundo para o país, e ele é catastrófico. Trata-se da mais completa negligência sobre atribuição de responsabilidades que já se viu e do uso político mais canalha possível de suas entrelinhas. O incidente em BH matou duas pessoas, feriu dezenas e reavivou uma relação conscientemente esquecida nas últimas semanas: Copa do Mundo e Dilma Rousseff. Sim, somente nas últimas semanas, pois desde junho do ano passado até o jogo de abertura do torneio, a presidente petista foi brutalmente massacrada por uma avalanche de indignados contra a sua realização, em grande parte criados por uma gigantesca incompreensão que assola o país desde o alvorecer deste denuncismo que contaminou como viral todos os meios de comunicação.

Como bem lembrou Marcus Nascimento no Desafinado, parte da mesma comitiva que desembarcou em Zurique, em 2007, para a confirmação do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014, foi a primeira a se descolar do evento e colar nas palavras de ordem que invadiam as ruas com a hashtag #NãoVaiTerCopa. Mesmo antes, em 2011, Alvaro Dias usou a tribuna do Senado para sugerir que o Brasil desistisse da realização, tamanha incompetência do governo. 

Com o início dos jogos, o cenário se inverteu drasticamente. Hoje Dias é visto nas arquibancadas das arenas com familiares. Ronaldo deixou de sentir vergonha para dizer que tem muito orgulho do próprio país. Além de partidas eletrizantes, a Copa do Mundo também mostrou um país eficiente em infraestrutura urbana. Quase de imediato, os principais meios de comunicação do país passaram a enaltecer os avanços em transporte público, mobilidade urbana e organização. Não houve como esconder o sucesso no desempenho dos aeroportos. Agora, é a oposição quem está preocupada com uso político do evento, como confessou Aécio na abertura da campanha para presidente ontem.

De fato a Copa tem dona: a canalhice.

Abraços, 
Murilo

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