por MURILO CLETO
Itararé nunca tem nada. Todo mundo sabe. Itararé está largada. Não tem Cultura aqui. Se Cultura de Itararé fosse algo bom, não começava com Cu de Cuba. Vou-me embora pra Pasárgada. Ou pra Sorocaba. Lá tem Cultura. Aqui já teve. Antigamente tinha. Hoje em dia não tem nada, né. Itararé nunca tem nada.
Até aqui, foram 2 anos da gestão Cristina Ghizzi em Itararé. Durante boa parte deste tempo, ouvi dentro e fora do gabinete o mantra acima repetido como um velho cacoete. E olha que não foi só de quem, como dizem, não tem Cultura. Professores, médicos, advogados, desocupados, tanto faz. Itararé nunca tem nada.
Em janeiro de 2013, a Coordenadoria de Cultura ocupava a parte superior do Teatro Municipal Sylvio Machado e dispunha, à época, de 4 funcionários: a coordenadora, uma escriturária, uma auxiliar de serviços e um estagiário - isso além da biblioteca, que, apesar de pertencer à pasta, tem um demanda muito própria. Isso é pouco, muito pouco. O teatro estava inacabado. Erguido em 1987, continuava sem conclusão 25 anos depois. Isso é um absurdo, muito absurdo. Com um expediente diário de 5 horas e meia, a pasta não oferecia nenhum programa contínuo de espetáculos ou formação cultural. Circuito Sesc de Artes? Uma vez por ano. Oficina Cultural Grande Otelo? Uma vez por ano. E isso não é pouco: é simplesmente inadmissível.
Mas faltava dinheiro. A Cultura sempre foi o primo pobre de toda administração e isso todo mundo sabe. Em 2012, último ano da gestão Perúcio, o orçamento global anual da pasta não ultrapassava R$ 332.587,86. Em 2013, a conta permaneceu praticamente a mesma. O teatro ainda era o mesmo. A estrutura, mais ou menos a mesma também. Ao todo, a Coordenadoria podia contar com R$ 365.846,65 de orçamento próprio, com 68% já comprometidos com a folha salarial; 13% destinados a subvenções sociais; e menos de 15% para outros investimentos. Milagre não dava pra fazer. Mas também não precisava.
E não precisou. Já em março de 2013, o município foi selecionado para integrar, pela primeira vez na história de 7 anos de existência, o Circuito Cultural Paulista. O programa é uma realização do governo do estado de São Paulo, com execução da Associação Paulista dos Amigos da Arte, e que precisa de uma dedicação importante de parceria dos municípios pra acontecer. Desde maio do ano passado, já foram 14 espetáculos do CCP aqui. 4 mil pessoas assistiram a espetáculos de música, dança, teatro e circo em diversos pontos da cidade: o abandonado Teatro Municipal Sylvio Machado é um deles, assim como as praças São Pedro, Matriz, Avelino Vieira e São José.
Essa foi a primeira vez na história que teve arte nas duas últimas. E não foi qualquer arte. No Jardim Alvorada, ninguém menos que o 'Duo Morales', que já percorreu praticamente todo o continente com um espetáculo que encantou um bairro em que, efetivamente, nunca teve quase nada. A Vila Osório, então, recebeu simplesmente o Melhor Espetáculo Jovem de 2014, eleito pelo Prêmio São Paulo de Incentivo ao Teatro Infantil e Jovem. Foi a primeira vez na história que uma peça de teatro aconteceu ali.
O Parque Centenário também foi parte deste processo tímido de descentralização: no começo de maio, a Cia. Domínio Público esteve na Escola Municipal Juracy Martins pra apresentar o primeiro espetáculo de dança contemporânea já visto por lá. De quebra, um dos bailarinos ainda deu um pocket show fantástico logo depois. Aliás, Itararé nunca teve tanta dança: Domínio Público, Mercearia de Ideias, Dudude, Companhia Brasileira de Danças Clássicas. Parecia um sonho irrealizável, mas a São Paulo Companhia de Dança esteve pela primeira vez na cidade pra apresentar palestra e oficina gratuitas no Teatro Municipal.
Itararé também nunca teve tanta oficina. De que adianta apresentar espetáculo se ninguém ensina a fazer? De dança, foram 2. De teatro, 3 - uma delas em parceria com a Funarte e outra oferecida pela Nossa Trupe Teatral - que também deu espetáculo. De fotografia ou cinema, 13 - TREZE. Além do pleno funcionamento do Projeto Guri, que atende hoje 82 crianças e adolescentes, a Escola Municipal de Música dá os primeiros passos numa das salas do antigo centro cultural, que, aliás, precisou ter a biblioteca transferida graças os risco de desmoronamento.
Já teve cinema em Itararé. Remontam aos anos 1910 as primeiras exibições no cineteatro São Pedro. E, já faz tempo, ficou sem. Mas, desde o ano passado, com o Museu da Imagem e do Som, o programa 'Pontos MIS' chegou ao Teatro Municipal e, só em 2014, exibiu 38 filmes, em 61 sessões, pra quase 3 mil espectadores. Se os equipamentos à disposição da Coordenadoria estavam sucateados, novos foram conquistados junto ao governo do estado ainda no ano passado. As oficinas oferecidas através desta parceria, com os melhores profissionais do audiovisual no país, atenderam mais de 100 participantes neste ano. A praça Matriz recebeu também, em 2013, o Energia em Cena, com uma gigantesca estrutura que exibiu, por 2 dias, filmes nacionais com qualidade igual ou superior à maioria dos cinemas comerciais do país.
Com Blues Etílicos em 2013 e Mariene de Castro em 2014, o Circuito Sesc de Artes nunca foi tão forte. A parceria com a instituição amadureceu e proporcionou novas atrações ao longo do ano, como Eureka On The Street, Mariangela Zan e Choro das 3 - que só não se concretizou graças ao temporal no dia 9.
Itararé nunca teve tanta ligação com o Conservatório de Tatuí. Em 2013, a Big Band embalou o aniversário do município com um ritmo bem diferente do que se acostumou com anos de uma Festa do Peão financiada com centenas de milhares de reais dos cofres públicos. Este ano, o Grupo de Choro e o Jazz Combo realizaram concertos memoráveis em julho e agosto.
Itararé nunca prestigiou a Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo. Isso até dezembro de 2013. Na ocasião, a parceria com o governo do estado de São Paulo e a Pensarte realizou este sonho inimaginável. Casa cheia pra prestigiar um finíssimo repertório apresentado de graça, num domingo à tarde - e depois de acabado o Campeonato Brasileiro.
Itararé também ainda não tido o EmCena Brasil. Agora teve e a praça São Pedro ficou lotada por 2 dias pra acompanhar circo, música, oficinas, cinema e teatro em 13 horas de uma programação eletrizante. Com o Natal Encantado, quase todo dia de dezembro ofereceu pelo menos uma atividade durante as festividades.
2014 foi também o ano em que Itararé conheceu o Mais Cultura nas Escolas. Jardim Pauliceia e Vila Novo Horizonte passaram a sediar atividades culturais desenvolvidas por agentes locais dentro e fora do espaço escolar. O resultado são duas comunidades explorando o que se tem de riqueza, tão negligenciada por quem não as conhece.
Este também foi o 2º ano de parceria com o curso de História das Faculdades Integradas de Itararé para a realização da Semana de História. Em 2014, a programação foi dedicada a reflexões sobre os 50 anos do Golpe Militar e encerrada com um concerto no Teatro Municipal com músicas compostas e perseguidas durante o Regime Militar. 20 de novembro mais uma vez não passou em branco, literalmente, e o Com Ciência ofereceu atividades de todos os gêneros para celebrar a memória de Zumbi dos Palmares. Pra quem quer fugir do senso comum, todo mês tem Debates Contemporâneos.
Talentos locais também nunca foram tão apoiados. Além das atividades de formação, oferecidas em todas as grandes linguagens artísticas, as participações no Revelando São Paulo, no Mapa Cultural Paulista, na FEAGER e em tantas outras feiras regionais, foi garantida regularmente. No último dia 14, o 3º festival de bandas de rock foi realizado em 2 anos. O gênero entrou, definitivamente, para a programação do município: teve banda ao vivo no Sylvio Machado pra comemorar seu dia internacional, em julho; e a inclusão na tradicional Festa de São Pedro, que garantiu o fim de uma marginalização anacrônica. Ao contrário do que se veiculou num ou outro jornal, teve espaço pra todos os estilos: foram 3 edições do 'Pratas da Casa', evento que reuniu jovens talentos do sertanejo ao jazz, passando por samba, pop e MPB. O Coral Santo Antonio nunca teve tantas oportunidades de apresentação: abriu os maiores concertos recebidos na cidade ao longo destes 2 anos. Isso sem contar os encontros de corais e cantatas.
E porque ainda há muito a se fazer, neste ano o vanguardista protocolo de intenções concentrado no Sistema Nacional de Cultura também chegou até aqui. A partir de agora, Itararé tem prazo pra elaborar um Plano Municipal de Cultura, criar um Conselho Municipal de Política Cultural, elaborar uma Lei Municipal de Incentivo à Cultura, abrir um Fundo Municipal de Cultura e realizar a Conferência Municipal de Cultura - que também nunca teve, até 2013, quando aconteceu na Câmara de Vereadores. Num futuro próximo, recursos federais vão chegar ao município exclusivamente para a Cultura, como hoje já acontece com Saúde, Educação e Assistência Social, por exemplo.
Uma ou outra coisa também deve ter tido: Caravana da Leitura, I Feira da Literatura Itarareense, Nossos Artistas, Cultura Solidária, por exemplo. Quer dizer, alguma coisa até tem.
Ah, mas ninguém fica sabendo. Também pudera, com cartazes, faixas, carros de som, TV, rádio, jornais e redes sociais realmente não se atinge ninguém. Bom, hoje é segunda. Itararé nunca tem nada. O certo é ficar em casa. Se Itararé nunca tem nada, imagine segunda.
Abraços,
Murilo
Itararé também nunca teve tanta oficina. De que adianta apresentar espetáculo se ninguém ensina a fazer? De dança, foram 2. De teatro, 3 - uma delas em parceria com a Funarte e outra oferecida pela Nossa Trupe Teatral - que também deu espetáculo. De fotografia ou cinema, 13 - TREZE. Além do pleno funcionamento do Projeto Guri, que atende hoje 82 crianças e adolescentes, a Escola Municipal de Música dá os primeiros passos numa das salas do antigo centro cultural, que, aliás, precisou ter a biblioteca transferida graças os risco de desmoronamento.
Já teve cinema em Itararé. Remontam aos anos 1910 as primeiras exibições no cineteatro São Pedro. E, já faz tempo, ficou sem. Mas, desde o ano passado, com o Museu da Imagem e do Som, o programa 'Pontos MIS' chegou ao Teatro Municipal e, só em 2014, exibiu 38 filmes, em 61 sessões, pra quase 3 mil espectadores. Se os equipamentos à disposição da Coordenadoria estavam sucateados, novos foram conquistados junto ao governo do estado ainda no ano passado. As oficinas oferecidas através desta parceria, com os melhores profissionais do audiovisual no país, atenderam mais de 100 participantes neste ano. A praça Matriz recebeu também, em 2013, o Energia em Cena, com uma gigantesca estrutura que exibiu, por 2 dias, filmes nacionais com qualidade igual ou superior à maioria dos cinemas comerciais do país.
Com Blues Etílicos em 2013 e Mariene de Castro em 2014, o Circuito Sesc de Artes nunca foi tão forte. A parceria com a instituição amadureceu e proporcionou novas atrações ao longo do ano, como Eureka On The Street, Mariangela Zan e Choro das 3 - que só não se concretizou graças ao temporal no dia 9.
Itararé nunca teve tanta ligação com o Conservatório de Tatuí. Em 2013, a Big Band embalou o aniversário do município com um ritmo bem diferente do que se acostumou com anos de uma Festa do Peão financiada com centenas de milhares de reais dos cofres públicos. Este ano, o Grupo de Choro e o Jazz Combo realizaram concertos memoráveis em julho e agosto.
Itararé nunca prestigiou a Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo. Isso até dezembro de 2013. Na ocasião, a parceria com o governo do estado de São Paulo e a Pensarte realizou este sonho inimaginável. Casa cheia pra prestigiar um finíssimo repertório apresentado de graça, num domingo à tarde - e depois de acabado o Campeonato Brasileiro.
Itararé também ainda não tido o EmCena Brasil. Agora teve e a praça São Pedro ficou lotada por 2 dias pra acompanhar circo, música, oficinas, cinema e teatro em 13 horas de uma programação eletrizante. Com o Natal Encantado, quase todo dia de dezembro ofereceu pelo menos uma atividade durante as festividades.
2014 foi também o ano em que Itararé conheceu o Mais Cultura nas Escolas. Jardim Pauliceia e Vila Novo Horizonte passaram a sediar atividades culturais desenvolvidas por agentes locais dentro e fora do espaço escolar. O resultado são duas comunidades explorando o que se tem de riqueza, tão negligenciada por quem não as conhece.
Este também foi o 2º ano de parceria com o curso de História das Faculdades Integradas de Itararé para a realização da Semana de História. Em 2014, a programação foi dedicada a reflexões sobre os 50 anos do Golpe Militar e encerrada com um concerto no Teatro Municipal com músicas compostas e perseguidas durante o Regime Militar. 20 de novembro mais uma vez não passou em branco, literalmente, e o Com Ciência ofereceu atividades de todos os gêneros para celebrar a memória de Zumbi dos Palmares. Pra quem quer fugir do senso comum, todo mês tem Debates Contemporâneos.
Talentos locais também nunca foram tão apoiados. Além das atividades de formação, oferecidas em todas as grandes linguagens artísticas, as participações no Revelando São Paulo, no Mapa Cultural Paulista, na FEAGER e em tantas outras feiras regionais, foi garantida regularmente. No último dia 14, o 3º festival de bandas de rock foi realizado em 2 anos. O gênero entrou, definitivamente, para a programação do município: teve banda ao vivo no Sylvio Machado pra comemorar seu dia internacional, em julho; e a inclusão na tradicional Festa de São Pedro, que garantiu o fim de uma marginalização anacrônica. Ao contrário do que se veiculou num ou outro jornal, teve espaço pra todos os estilos: foram 3 edições do 'Pratas da Casa', evento que reuniu jovens talentos do sertanejo ao jazz, passando por samba, pop e MPB. O Coral Santo Antonio nunca teve tantas oportunidades de apresentação: abriu os maiores concertos recebidos na cidade ao longo destes 2 anos. Isso sem contar os encontros de corais e cantatas.
E porque ainda há muito a se fazer, neste ano o vanguardista protocolo de intenções concentrado no Sistema Nacional de Cultura também chegou até aqui. A partir de agora, Itararé tem prazo pra elaborar um Plano Municipal de Cultura, criar um Conselho Municipal de Política Cultural, elaborar uma Lei Municipal de Incentivo à Cultura, abrir um Fundo Municipal de Cultura e realizar a Conferência Municipal de Cultura - que também nunca teve, até 2013, quando aconteceu na Câmara de Vereadores. Num futuro próximo, recursos federais vão chegar ao município exclusivamente para a Cultura, como hoje já acontece com Saúde, Educação e Assistência Social, por exemplo.
Uma ou outra coisa também deve ter tido: Caravana da Leitura, I Feira da Literatura Itarareense, Nossos Artistas, Cultura Solidária, por exemplo. Quer dizer, alguma coisa até tem.
Ah, mas ninguém fica sabendo. Também pudera, com cartazes, faixas, carros de som, TV, rádio, jornais e redes sociais realmente não se atinge ninguém. Bom, hoje é segunda. Itararé nunca tem nada. O certo é ficar em casa. Se Itararé nunca tem nada, imagine segunda.
Abraços,
Murilo
O que percebo é que uma boa parcela dos que mencionam isso, se não for todos, estão querendo dizer que Itararé nunca tem nada em relação à encher a cara no final de semana, acompanhado de uma azaraçãozinha e situações para se inflar o ego.
ResponderExcluirIsso me faz perceber que falta à quem diz isso perceber que lazer não é só o que Itararé oferecia antes, você pode muito bem ter um programa legal, sem precisar encher a cara, ter algo mais saudável e agradável principalmente pra mente, como os programas que você citou, trazidos por vocês da Cultura.
Me parece que o que os que reclamam querem é só uma farra nova todo final de semana.
Eu acho que Itararé (não generalizando) ainda está presa no lazer ser apenas o que citei. E o trabalho da Cultura está amadurecendo a cidade nesse quesito, e acho que gradualmente elas (algumas) vão entrar neste novo âmbito cultural, irão expandir a consciência um pouco e perceber o que de bom a Cultura está trazendo pra cidade, possibilidades além das "tira gosto pra Festa do peão (baladas)".