segunda-feira, 20 de julho de 2015

Cunha espanou

Talvez seja cedo demais pra decretar o seu fim, mas aquele Eduardo Cunha espanou. Porque é também tarde demais pra que ele saia ileso da escolha crucial que o tirou da sombra pros holofotes

por MURILO CLETO



Até bem pouco tempo atrás, a maioria dos analistas políticos devia se perguntar, ainda que em silêncio, o que seria desta nova versão de Eduardo Cunha anunciada por um mais que turbulento 2015. Homem dos bastidores, apareceu ainda nos anos 90 sob a tutela de Fernando Collor na presidência da Telerj e partir daí passou a ocupar importantes cargos de confiança, como o comando da Companhia Estadual de Habitação na gestão Anthony Garotinho. Nesta época, já investia na aquisição de rádios evangélicas.

Em 2002, Cunha foi eleito pela primeira vez deputado federal pelo Rio de Janeiro já com a legenda do PMDB. E, de lá pra cá, permanecia um ilustre desconhecido, à exceção das empresas que frequentemente o reelegem a partir de então com aporte financeiro estratosférico. O investimento (há quem chame de doação) chegou a quase R$ 7 milhões declarados.

Segundo pesquisa do Datafolha do último mês de junho, quando já ocupava a presidência do legislativo federal, Eduardo Cunha só é "bem conhecido" por 5% da população. Mas é bem provável que este quadro esteja mudando radicalmente diante da queda de braço travada com o governo na aprovação de projetos de lei ou emendas constitucionais. Foi assim com o PL das terceirizações e com as PECs do financiamento empresarial de campanha e da redução da maioridade penal.

O cálculo de Cunha é simples: 91% dos brasileiros não confiam em partidos políticos; somente 9% aprovam Dilma. De uma vez só, rompeu com o próprio partido e, de uma vez por todas, com o governo. Seu objetivo é mostrar aos eleitores que não se rende ao fisiologismo nem à estrutura burocrática partidária e cair nas graças do antipetismo raivoso. 

Mas no meio do caminho havia uma pedra. A Operação Lava Jato, que, no imaginário comum, tinha tudo pra começar e acabar no Partido dos Trabalhadores, acertou quase todo mundo: da oposição à situação, passando pelo meio que dança como toca a música. Na lista de Rodrigo Janot, Eduardo Cunha passou a atacá-lo publicamente com ênfase cada vez mais estridente. Exigiu do Planalto sua cabeça e, como não houve sinalização favorável, partiu pro combate inconsequente. 

Horas depois de oficializar o rompimento com o governo, na última sexta-feira, aceitou 11 pedidos de impeachment até então engavetados e aprovou a CPI do BNDES, que há tempos ronda o Congresso. Tudo isso só um dia depois de ser delatado por Júlio Camargo, ex-consultor da Toyo Setal, que sustentou ter sido coagido a pagar R$ 5 milhões a Cunha como propina. 

Que sejam essas pressões perfeitamente naturais no submundo da política institucional, o erro de Eduardo Cunha foi ter gostado demais dos holofotes. Na sombra, agia como queria e garantia sucessivas reeleições afagando as empresas financiadoras de suas campanhas com o poder da caneta e da influência no Congresso. Sob a luz, quis chamar pra si o papel de referência anti-PT e está pagando caro com uma exposição que nunca lhe foi costumeira. Agora tem que lutar contra o próprio lastro deixado pelo longo caminho até aqui, com acusações de falsificação, irregularidades e coação. Somem-se a elas as mais recentes declarações que deixam claras as ações em retaliação às investigações da Procuradoria-Geral da República.

Até aqui, Cunha já perdeu o governo, o próprio partido e boa parte das empresas financiadoras. E a julgar pelo pronunciamento realizado na noite de sexta, pouco tempo depois do anúncio do rompimento, dificilmente vai ser eleito graças à capacidade discursivo-carismática.

Talvez seja cedo demais pra decretar o seu fim, mas aquele Eduardo Cunha espanou. Porque é também tarde demais pra que ele saia ileso desta escolha crucial. De um jeito ou de outro, é bom que estude melhor os próximos passos pra não acabar sustentado somente pelo distinto grupo capitaneado por Marisa Lobo e Reinaldo Azevedo.

Abraços, 
Murilo

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