quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Pelo direito a indecidibilidade

por SANDRO CHAVES ROSSI



Quem acompanha o Desafinado há algum tempo, sabe que 80% do que discutimos aqui é sobre política - se não fosse pela Luisa seria uns 90%. Também da pra ter uma breve noção da orientação política de cada um que escreve aqui, mesmo com as nossas divergências em alguns assuntos - sim, críticos, há divergências e discussões entre nós. A questão é: cada um de nós leu o suficiente para formar uma opinião e acabar se "encaixando" em alguma ideologia. Esse é o ponto. 

Podemos estimar que há pelo menos duas grandes manifestações a cada semestre no Brasil, sempre seguindo a mesma linha: a oposição convoca uma manifestação e a situação convoca uma logo em seguida. Algo com um intervalo de 3 a 4 dias entre uma e outra. Quem acompanha essas manifestações, ou pelo menos olha de longe, sabe que existe vários tipos de "malucos" e que cada um defende algo diferente. O que os une em uma manifestação, geralmente, é algo maior e que todos eles têm em comum. 

Por exemplo, as manifestações da oposição são geralmente motivadas pelo combate à corrupção e pelo macarthismo - ideologia "anti-comunista". Já as manifestações da situação são motivadas pela defesa da democracia e dos direitos da população. Porém, no meio disso tudo há inúmeras correntes ideológicas. Mais alguns exemplos: quem vai na manifestação da oposição, não é necessariamente a favor da oposição partidária, há muita gente que pede a volta dos militares ao poder, uma discrepância enorme em relação à noção de democracia. O mesmo vale para as manifestações da situação: enquanto há uma boa parte de governistas, há uma parte que também é oposição, mas preza pela democracia e reivindica direitos que estão sendo tirados da população. 

As divergências ideológicas, mesmo quando possuem algo em comum, são inerentes à democracia. É aí que entra o questionamento: em meio a toda essa efervescência política, quantas pessoas realmente buscaram ler sobre aquilo que defendem? Buscaram conhecer o "outro lado" para ter discernimento do panorama político brasileiro? Sei que soa como prepotência dizer isso, mas, por exemplo, uma pessoa que sai às ruas exaltando um período lamentável e cruel, como foi a ditadura militar brasileira, sabe realmente o que está dizendo? Mesmo quando a história mostra realmente o contrário? Isso vale também para o outro lado da moeda: é bem comum ver segmentos da esquerda criticarem a truculência da polícia brasileira em alguns estados governados pela direita enquanto faz vista grossa para o mesmo feito em estados governados pela esquerda. 

Antes que alguém venha me questionar: não, não sou contra as manifestações. Vivemos em um sistema democrático onde todos são livres para se manifestarem. O que é preocupante são a propagações de ideias absurdas e que já foram superadas há muito tempo. Mas quem são essas pessoas que ainda insistem nessas ideias? Em sua grande maioria, pessoas comuns. Pessoas que trabalham, estudam, pagam suas contas, tem família, tem amigos, torcem para algum time, nada que os diferencie de mim ou de você. 

Então por que eles aderem a essas ideias? Por indignação, medo, raiva, frustração, qualquer coisa que um governo ruim traria para qualquer um de nós. Independente da ideologia, todos nós temos medo de perder o emprego, de não conseguir comprar um brinquedo que o filho quer, de não conseguir pagar as nossas contas, de não fazer aquela viagem que sempre sonhamos. Esses sentimentos nos perseguem diariamente, e, em uma crise, eles se intensificam. Mesmo com toda a indignação, não devemos cobrar de quem tem as emoções à flor da pele, por mais que nos irritem às vezes. 

Também não digo para as pessoas saírem por aí pegando um monte de livros ou lerem "A Riqueza das Nações" do Adam Smith ou "O Capital" do Karl Marx, até porque são leituras muito complexas e ninguém tem tempo pra perder com isso - também são obras muito extensas; quando eu falo em perder tempo, é muito tempo mesmo. O que pode ser feito é a ponderação, ouvir os dois lados, conhecê-los. Não há absolutamente mal nenhum em ficar indeciso, ninguém é obrigado a escolher um lado simplesmente por escolher. Quando fazemos isso, perdemos nossa capacidade de raciocinar, deixamos de ser donos de nós mesmos e aceitamos tudo que nos é dito. 

Aceitamos tudo que nos dizem porque temos medo de raciocinar e falhar. Não há mal nenhum em se ter dúvida, em não chegar à conclusão nenhuma sobre um determinado assunto. Temos que perder o medo de expressar dúvida nos casos "indecidíveis" em que a dúvida é a posição mais sensata que se pode ter. Se acertamos, não vai ser muito relevante que estávamos em dúvida, mas admitir que havia tem o efeito humilde de aceitar que o acerto não foi um completo mérito. Se errarmos, a admissão da dúvida aliviará ao menos em parte a nossa culpa, pois pode ser que, diante das informações disponíveis e da limitação de tempo, tenhamos feito o melhor que podíamos, e se erramos não foi por má fé e nem ignorância, mas por termos sido forçados a decidir no que era "indecidível". 

Pode ter certeza que muitos que escrevem, não só aqui no Desafinado, mas como também em revistas, jornais e até mesmo artigos acadêmicos, sofrem todos os dias com a dúvida do que estão fazendo ou pensando. Quem escreve esse texto é um estudante de engenharia que tem muito pouco conhecimento comparado aos companheiros que aqui também escrevem, mas que aprendeu que não é vergonha nenhuma mudar de ideia e que, muitas das vezes devido às nossas limitações, ter dúvida é o que nos torna mais sensatos diante de situações tão caóticas.

5 comentários:

  1. Perfeito! Esse texto diz tudo, muitas vezes nós sentimos vergonha em ter dúvida sobre o que pensar desse circo todo. Parabéns, Sandro, ótima reflexão

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  2. conservador opressor19 de agosto de 2015 às 11:47

    é bem coisa dessa esquerdalha tentar levar os outros pela emoçao

    agora vc ta em duvida sandro? hahaha hahaha hahaha

    esse sandro alem de comunista é corintiano, não me convensce

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    1. conservador opressor e BURRO
      volta pra escola!!!!!!!.

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  3. gostei da sensibilidade que o autor teve em escrever esse texto

    adorei

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  4. Sua sensibilidade seria melhor apreciada se fosse antes do término do terceiro turno, seria uma voz e um gesto muito mais interessante, agora, infelizmente, é apenas um pensamento singelo no meio da derrocada e do caldo que amornou.

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