por JANAÍNA MAYRA DE OLIVEIRA WEBER
O que é necessário para ser um bom presidente? Um bom governador ou prefeito? O que significa estar bem preparado? O que faz ou deve fazer um vereador, deputado ou senador? Quais são suas atribuições e deveres?
Se a resposta a essa pergunta é tão importante a quem vota, deve-se considerar muito mais a quem recebe o voto, pois, a medida que se desvela as reais atribuições de cada cargo eletivo, desvela-se também nosso analfabetismo político e com isso, a tendência em manter uma estrutura política chamada “clientelismo”, independentemente das danças das siglas de partidos.
Clientelismo vem da palavra cliente e é uma forma de ver e tratar da coisa pública como negociação ou transação comercial, mesmo que muitas vezes não implique a presença de dinheiro em espécie nas mesmas, podendo ser favores, cargos ou protecionismos.
O que sustenta o clientelismo é tanto a falta de escrúpulos quanto o analfabetismo político, pois esse último impede o entendimento do funcionamento da estrutura por parte do eleitor/cliente.
Pode-se evidenciar o nível crítico de analfabetismo político-social brasileiro quando nos deparamos com a circulação de frases e afirmações que chamam petistas de comunistas (quando “nunca na história desse país” se viu tanto capital estrangeiro fincando suas garras em solo brasileiro - vide o numero de montadoras internacionais de carros se instalando no Brasil nos últimos dez anos), ou quando um deputado faz uma faixa agradecendo a ditadura militar pelo Brasil não ter virado Cuba e tem gente que aplaude, ou ainda quando alguém procura um vereador pra este pagar sua conta de luz e não para ajudar a resolver o problema da falta de iluminação de determinada rua.
O que significa ter uma função pública eletiva hoje em dia? Qual é o imaginário das pessoas em relação a isso? Observa-se uma atmosfera de negatividade ao se falar de política e um niilismo (quando todos os valores perdem seu significado) associado a uma onda pessimista de discurso fácil em que nada nem ninguém presta.
Por que se chegou a esse ponto? Por que temos um cenário político invadido por uma grande porção de oportunistas que “pejorativam” o conceito de política? E por que pessoas sérias e honestas, que procuram fugir a essa visão clientelista das relações estabelecidas pelo estado, são ofuscadas, desqualificadas e se obrigam a engrossar uma polarização do debate pra lá de ultrapassada?
O analfabetismo político não é só uma característica de pessoas que não possuem condições de entender um cenário político no âmbito de suas relações, mas também de pessoas que possuem uma concepção viciada do sistema e que por causa disso não conseguem vislumbrar sequer uma possibilidade alternativa a sua usual.
Essas pessoas, por exemplo, entendem ser muito natural usar a máquina pública para angariar votos, entendem isso como honesto inclusive, como exemplo o vereador que, quando procurado por uma família com uma receita médica, ao invés de instruir seu eleitor quanto a seu direito em ter ou não aquele medicamento e quais procedimentos corretos para adquirir, ou ainda procurar apurar quando se trata de uma denuncia de falta de remédios acionando os órgãos e pessoas responsáveis, ou pegam a receita do paciente e vai até a farmácia popular pegar os medicamentos ou mesmo os compra, porque sabe que o que ficará gravado para aquela família é que aquele vereador lhes conseguiu o remédio e não que era seu direito obtê-lo. E segue-se a mesma lógica no que se refere ao asfaltamento da rua, a iluminação pública e não oferece o entendimento de que estes acontecimentos possam fazer parte de todo um sistema de direitos, bem como, de planejamento.
Em Itararé, por exemplo, virou uma praxe por parte de um determinado vereador fazer solicitações hiperbólicas ao poder executivo (construção de estádio, piscina, programa de ginástica olímpica, pista de Trike) como se o mesmo vereador não fosse o mesmo que vota o orçamento, ou o mesmo que vota decidindo como e onde devem ser gastos o dinheiro da arrecadação de impostos. Analisando esses pedidos é possível se chegar a duas conclusões, ou o vereador não sabe as atribuições inerentes ao cargo, o que é o seu trabalho ou sabe e, se sabe, usa de má fé a informação quando o poder executivo não tem condições de realizar tais empreendimentos, bem como as leis relacionadas a geração de despesas. Em ambos os casos isso é muito ruim para o processo político, pois em ambos os casos se dá a falsa impressão que o nobre edil está trabalhando, mas não está.
No Facebook tem um grupo chamado “Façam um vereador de Itararé trabalhar”, mas como fazer um vereador trabalhar se não se sabe qual é o trabalho do mesmo de fato? E na direção dessa mesma estrutura política torpe, este o grupo que poderia servir de ferramenta de participação política, de interação e manifestação dos anseios da população, também não tem a intenção de informar os cidadãos sobre isso e hoje serve de palanque e antro de maledicência, calúnia e difamação. Já sobre vereança mesmo, tem muito pouco ou quase nada.
Ser eleito pelo voto é ser escolhido para desempenhar uma função pública, não importa se presidente do Brasil ou de um conselho e entende-se por função pública a competência ou a atribuição, cujo exercício está sujeito ao interesse público da coletividade ou da Administração [pública] (JUSBRASIL, s/d).
Enquanto o funcionalismo público, de regime estatutário, passa pelo processo de “profissionalização” com o discurso da necessidade de se qualificar o serviço (o que na verdade por ser entendido também como um eufemismo para a implantação da meritocracia) os cargos eletivos não andam na mesma direção, porque ninguém está interessado na verdade em saber as suas funções e sim no que, quem ocupa este cargo pode oferecer diretamente a minha pessoa, seja remédio, asfaltamento da rua, emprego para o filho ou sobrinho, dentadura e etc independente disso fazer ou não parte de um planejamento maior.
A Administração Pública legitima-se quando age em conformidade com o interesse público. Nesse contexto, a profissionalização da função pública constitui instrumento de legitimação da administração pública brasileira perante o povo: (i) primeiro, para garantir a observância do princípio da igualdade na escolha de seus agentes, a partir de critérios que possibilitem a aferição daqueles mais preparados para o exercício da profissão, e não num status atribuído em razão de um direito de nascença ou pela proximidade pessoal com os governantes; (ii) segundo, para dar cumprimento ao princípio da eficiência, de uma administração capacitada a responder aos anseios coletivos mediante a prestação de serviços adequados (BARCELAR FILHO, 2003).
Também não se quer dizer aqui que se deva ter concurso público para presidente, mas sim que a tomada de consciência política parte necessariamente da ciência dos pré-requisitos para o cargo por parte dos eleitores, bem como da analise da trajetória profissional e política de cada candidato pra se tentar deduzir o mais preparado.
Mais uma eleição presidencial se aproxima e mesmo a intelectualidade brasileira (os tais formadores de opinião), não parecem se preocupar em discutir o que se espera de um indivíduo pra se governar um país continental e promissor frente aos desafios que a economia de mercado predatória impõe. Se assim o fizéssemos também saberíamos o que e como cobrar não importando de quem, mas só a cobranças ligadas ao partidarismo de forma que fica-se o tempo todo justificando o erro de um pelo erro do outro. A mesma intelectualidade se atém às trocas de acusações e também polarizam o debate no velho maniqueísmo de sempre (PT X PSDB).
Mais uma eleição presidencial se aproxima e não discutimos a reforma política, levanta-se apenas as bandeiras genéricas de “mais educação, segurança e saúde” sem saber ao certo qual educação se quer e sob qual conceito de saúde se reivindica (mais saúde ou mais remédios? Mais remédios é mais saúde? mais segurança é mais polícia ou não precisar da ação da polícia?).
Enfim, a conjuntura mundial que se desenha é a necessidade de se pluralizar o debate, as ideias, as ações e a busca de soluções e para isso é necessário ir além do discurso fácil que procura somente dar nome a meia dúzia de bois ou condenar esse ou aquele, é necessário também querer entender a estrutura maniqueísta e clientelista que sustenta essa política brasileira, na qual, quem não joga o jogo dos velhos jogadores, não entra, e se entra não fica. Do contrário, as eleições nunca passarão de troca de figurinhas carimbadas não importando o quão vermelhas ou azuis elas possam parecer.
REFERÊNCIAS:
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Profissionalização da função pública: a experiência brasileira. Revista de Direito Administrativo, v. 232, abril/junho 2003.
COELHO, Direito da Administração Pública. revista do tribunal de contas DO ESTADO de Minas Gerais abril | maio | junho 2009 | v. 71 — n. 2 — ano XXVII.
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