5 de outubro está chegando e, com a data, os principais dilemas das eleições. Nesta série de postagens que se estende até segunda-feira (18 de agosto), os integrantes do Desafinado anunciam o voto para presidência da República e justificam a escolha.
O BRASIL QUE TEMOS PARA O BRASIL QUE QUEREMOS
Por que Luciana Genro?
por LUIS FELIPE GENARO
É consenso entre cientistas sociais das mais diversas ramificações que presenciamos nas manifestações e protestos do ano passado – as chamadas Jornadas de Junho – um abalo significativo nas estruturas do país. Talvez, na mais sintética das análises, essa geração que não pôde lutar contra os gorilas da ditadura, teve a chance de mostrar aos súditos do capital que não age, fala e pensa somente via Facebook e outras redes sociais.
Praças, ruas e avenidas foram tomadas ora de forma pacifica, ora de forma violenta. Cartazes com as mais diversas frases e anseios foram erguidos. A imprensa nativa, atemorizada, ora pôs-se ao lado dos manifestantes, ora contra. No Congresso Nacional e no Palácio do Planalto, uma pressão há tempos não sentida.
De fato, a classe dirigente como um todo – ou, como diria Raymundo Faoro, os "donos do poder" –, por alguns poucos dias, não dormiu sossegada. Os pequenos acontecimentos que marcaram aqueles dias de agitação serão lidos pela História de forma mais acurada em alguns poucos anos. “A vida que pulsava transbordou, e o dique da ideologia não foi capaz de contê-la”, relembra Mauro Iasi.
Durante as Jornadas, inúmeras questões foram surgindo e assuntos, outrora relegados apenas a alguns poucos espaços e sujeitos, começaram a ser debatidos com maior ênfase até mesmo nas calçadas dos grandes centros. Aulas públicas passaram a ser então uma realidade agora com uma maior visibilidade. Por que não discutir a democratização das mídias em praça pública? Por que não debater os benefícios da descriminalização da maconha e a derrocada da “guerra às drogas” em avenidas lotadas? Neste ínterim, greves foram deflagradas e o calor da manifestação, principalmente com o advento da Copa do Mundo, permaneceu uma constante.
Sem sombra de dúvidas, a democracia representativa brasileira – e, por que não, a ocidental – vem sofrendo reveses e abalos nunca antes imaginados, inerte em uma esteira de crises sem um fim determinado. Nossa democracia vem sendo duramente criticada por ter se tornado um sistema extremamente limitado, pois somos levados de quatro em quatro anos a eleger governantes e parlamentares que, muitas vezes, nem sequer os conhecemos. Sem contar as façanhas da esfera financeira que há tempos vem impondo suas vontades à esfera política. No fim, vivemos uma plutocracia de democratas, um governo que em tese deveria ser guiado pelo povo, passa a ser dirigido por técnicos, banqueiros e burocratas.
A esquerda brasileira, durante anos, lutou para que um dos maiores partidos de massa do continente americano, o Partido dos Trabalhadores (PT), chegasse aos degraus mais altos do poder. Chegando lá, desmantelaria toda uma estrutura de Estado envolvida por corruptos e corruptores, iniciando um processo de mudanças jamais vista antes. A revolução, de fato, não aconteceu. Deixando de ser o agitador revolucionário, o Partido dos Trabalhadores passou a ser o reformador conivente.
Mauro Iasi acusa: “O caminho escolhido pelo ciclo do PT e sua estratégia, desarmou a classe trabalhadora e sacrificou sua independência pela escolha de uma governabilidade de cúpula na qual a ação política organizada da classe jamais foi convocada [...]. O acordo com a burguesia produziu na base social uma reversão na consciência de classe e uma inflexão conservadora no senso comum”.
Muitos conhecidos contra argumentam que, caso o partido não tivesse se aliado aos donos do poder, tornando-se efetivamente um deles, algumas das reformas sociais planejadas nunca teriam sido implantadas de forma efetiva. É sabido que as marcas dos governos petistas são, de fato, o início da descentralização de renda e a possibilidade de crédito e mobilidade aos mais pobres.
É espantoso que, nos dias de hoje, o Partido dos Trabalhadores venha ratificar a ideia perversa da classe estabilizante, difundida principalmente pelo intelectual esloveno Slavoj Žižek, a qual ele explica: “não é [em si] a velha classe dominante, mas aqueles comprometidos com a estabilidade e continuidade da ordem política e econômica – a classe daqueles que, mesmo quando clamam por mudança, o fazem para assegurar que nada realmente vá mudar”. Angustiado e consciente, lhes indago: e agora?
Tendo em vista todas as questões que apontei, sou levado a concluir que desacredito na política como está sendo gerida e nas eleições como estão sendo gestadas. Finalmente expresso uma ojeriza implacável pela democracia racionada e furtada pela qual vivemos. Por outro lado, a presidenciável Luciana Genro, advogada, ativista e candidata pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) – fundado por aqueles que se insurgiram contra o Partido dos Trabalhadores logo no início do governo Lula –, tem em suas discussões e debates diários, escutado as vozes que ecoaram durante as Jornadas de Junho e que ecoam até os dias de hoje.
À frente de temas polêmicos e de máxima urgência ao país, Luciana tem se colocado contrária aos projetos de governo lavados na mesmice, na ânsia por votos e holofotes e no espetáculo das grandes fortunas destinadas a campanhas e propaganda. Imersa neste novo tempo do mundo, nos novos e velhos movimentos sociais e ciente dos obstáculos impostos pelo capitalismo, pela globalização e por uma estrutura de Estado ainda imbuída em arcaicos estamentos, Luciana Genro mostra-se preparada para governar o Brasil.
Contudo, não acredito que sozinha possa governar qualquer coisa. E quando digo “sozinha”, não me refiro aos céus escuros da governabilidade. Refiro-me ao povo brasileiro. Às universidades, à nova intelectualidade, às mídias independentes, aos comitês, associações de bairro, pequenos produtores rurais, tribos indígenas, aos movimentos sem-terra e sem-teto, aos professores, garis, domésticas, operários, zeladores e, não menos importante, aos jovens que foram às ruas em julho de 2013.
Os verdadeiros e legítimos donos do poder.
Referências:
IASI, Mauro Luis. A rebelião, a cidade e a consciência. 2013.
ŽIŽEK, Slavoj. Quando apenas a heresia pode nos manter vivos. In: http://blogdaboitempo.com.br/2012/11/23/artigo-de-slavoj-zizek-sobre-a-reeleicao-de-barack-obama/. 2012.
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