por LUISA DE QUADROS COQUEMALA
Hoje, vamos falar (com prazer) de Ondjaki. Nascido em Luanda, em 1977, ele é uma figura no mínimo interessante. Formado em sociologia, terminou em 2010 seu doutorado em estudos africanos, na Itália. Além disso, o luandense já conquistou, por aqui, o Prêmio Jabuti de Literatura na categoria Juvenil. E há, ainda, a honra de termos o autor em nossas terras: atualmente, ele reside no Rio de Janeiro.
Pensar em Ondjaki é a mesma coisa que recordar a célebre declaração de JD Salinger: “O que realmente me arrebata é um livro que, quando termina-se a leitura, você deseja que o autor que o escreveu fosse um grande amigo seu e que você pudesse ligar para ele quando sentisse vontade. No entanto, isso não acontece com frequência”.
Eu não sabia exatamente o que esperar quando me deparei com seu livro de contos, e se amanhã o medo, publicado em 2005. Apesar da belíssima edição feita pela Língua Geral (minha única certeza até então), o fato de não haver expectativas deixou a surpresa ainda mais agradável.
Ondjaki sabe pintar belos quadros. Cada um de seus contos (cenas, pequenos acontecimentos) são escritos com uma delicadeza ímpar. O autor vai fundo. Atinge aquele tipo de escrita que toca e sensibiliza, te transportando para outra realidade de uma maneira tão brilhante que arranca suspiros dos mais duros.
O autor luandense sabe escrever, eis um fato. Em língua portuguesa, atualmente, difícil encontrar algo tão bem trabalhado, tão comovente e honesto – dando o efeito da leveza de uma brisa num dia de calor. E, afinal de contas, não foi Hemingway quem disse (acertadamente) que uma boa história precisa de alguns destes atributos para ser boa?
O livro e se amanhã o medo é dividido em duas partes (partes estas inspiradas em A Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar): horas tranquilas e conchas escuras. A primeira traz histórias mais leves, enquanto que na segunda o clima já é de mais tensão. De qualquer maneira, o panorama final é incrível, a vista é única. E, de fato, o autor consegue criar um belo livro, montado uma espécie de quebra cabeça cujas peças são justamente suas pequenas obras primas. Assim, atinge a excelência em diversos contos: coração de porco, a confissão do acendedor de candeeiros, a esquina, a filha da sogra, madrugada etc.
Fico feliz quando leio livros como este de Ondjaki. Não apenas pelas belas doses de reflexão, mas também por minha alegria ao ver algo tão bem escrita na nossa língua. Ondjaki e seus contos conseguem arrancar sorrisos discretos e verdadeiros. E só por isso já basta ler um livro seu.
FICHA TÉCNICA
Título: e se amanhã o medo
Autor: Ondjaki
Nacionalidade: luandense
Edição: Língua Geral (2010) e Caminho (2005 e 2010)
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