segunda-feira, 23 de março de 2015

Professores em Itararé desafiam truculência do governo do estado

Apesar das tentativas de desestabilização, movimento só tem crescido desde a segunda-feira, quando a greve foi deflagrada

por MURILO CLETO


Desde o dia 13 de março, os professores da rede pública estadual de São Paulo estão em greve, conforme decretado em assembleia pela Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo. 

Em 2015, o Ministério da Educação anunciou que o piso nacional para professores seria reajustado em 13,01%. Apesar da medida, o governo do estado se negou a reajustar o salário dos docentes este ano. O argumento oficial da Secretaria de Estado da Educação é o de que o piso estadual é 26% superior ao nacional. O problema é que em 2009 a diferença era de 59%, o que só demonstra a desvalorização da categoria. De acordo com o Dieese, se não houver recuperação do piso salarial de São Paulo, a remuneração do professor do estado mais rico do país será menor do que o piso já em 2016. 

Para alcançar equiparação aos demais profissionais com ensino superior, conforme prevê a meta 17 do Plano Nacional da Educação, o reajuste deveria ser de 75,33%. Com uma ação no Supremo Tribunal Federal, a APEOESP reivindica também que o governo do estado cumpra a jornada do piso, que determina um terço da carga horária para atividades extraclasse.

Além disso, os professores da rede reclamam da falta de materiais nas escolas, do corte de investimentos para sua manutenção e da redução de coordenadores pedagógicos nas unidades. Professores da categoria "O", temporários, são forçados por lei a uma "folga" de 200 dias, que não lhes permite lecionar na rede durante o período. Com o fechamento de 2.700 salas, a superlotação virou uma realidade constante.

Em artigo publicado em setembro, Osvaldo Rodrigues Junior trouxe números pesados a respeito da qualidade do ensino em São Paulo: 10º lugar no ranking de investimentos na Educação no país; 7º no de aprendizado, com 46% dos alunos aprovados sem aprender; e o pior resultado do Ensino Médio no SARESP de 2014 em 6 anos.

Até a sexta-feira, dia 20, a APEOESP contava com a adesão de 60% dos professores da rede. Displicente, o Secretário de Estado da Educação afirmou que o não comparecimento às escolas era de apenas 4% na quinta-feira, índice considerado dentro da média, levando em consideração faltas abonadas, médicas e injustificadas.

Em Itararé, o movimento começou discreto. Na segunda-feira, o professor Samuel de Lara cruzou os braços em apoio ao movimento. Em seguida, Ricardo Xavier Cordeiro protocolou a adesão. Os dois professores participaram do ato realizado pela APEOESP em São Paulo, na sexta-feira. Com o desenrolar da semana, a greve ganhou o ingresso maciço dos professores da E. E. Heitor Guimarães Côrtes, que têm percorrido as demais escolas da região, realizado encontros com docentes interessados e discutido o tema em veículos locais de comunicação. A última informação é a de que 30 professores já oficializaram a paralisação no município.


De acordo com o prof. José Geraldo da Mota Junior, a maior dificuldade do grupo é a aceitação dos dirigentes. "Tem escola em que nós não podemos nem passar perto", disse, como é o caso da Escola Estadual Prof. Caetano Carbone. Com a proibição da entrada nas unidades escolares, a comunicação com os colegas fica muito difícil. Para driblar o isolamento, foram criados fóruns no Facebook e no Whatsapp em que os docentes discutem as próximas ações e tiram dúvidas uns dos outros.

O professor Sandro Azevedo, um dos articuladores do movimento na cidade, argumenta que o principal motivo de impedimento dos professores que desejam aderir à greve é o medo de retaliações do governo: "os profissionais da categoria 'O' recebem ameaças de que terão seus contratos rompidos". Para desconsiderar a paralisação, as escolas estão chamando professores desempregados ou estudantes ainda na graduação para substituir os grevistas. Aqueles que se recusam a substituir os companheiros em greve são coagidos com ameaças de que podem perder projetos que executam nas unidades, como o Mais Educação e o Professor Auxiliar. Muitos ouvem que não serão mais chamados em caso de declínio.

Para juristas, a substituição de profissionais grevistas é ilegal. Como não há lei específica para greve no setor público, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que vale a legislação vigente para os que atuam na iniciativa privada. Desta forma, a Lei 7.783/83 determina que "é vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento”. O Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo já se posicionou sobre a nulidade da contratação de substitutos durante a greve:

GREVE. PEDIDO DE NULIDADE DAS CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS. ACOLHIMENTO. A conduta patronal que inviabiliza o exercício do direito de greve e assim se configura a de contratar trabalhadores substitutos, viola o direito fundamental de realizar a greve como meio de resistência e reivindicação. Como nenhum direito se reveste de caráter absoluto, a lei regente do direito de greve atribui ao Poder Judiciário a definição das medidas que garantem, em cada caso, a prestação dos serviços que devem atender às necessidades inadiáveis da comunidade (art. 12). Não tem eficácia jurídica, portanto, a norma interna que, preventivamente, autoriza as diretorias regionais a contratar trabalhadores substitutos em hipótese de greve (TRT 2-SP. Acórdão nº 01228.2008.003.20-00-2. Publicado em 12.01.2010. Relator: Des. Augusto César Leite de Carvalho. Votação unânime) (grifamos).

"Na minha escola, hoje de manhã (sexta-feira, dia 20) só tinha um professor trabalhando e não tinha eventual nenhum para substituir os demais. A escola vai insistir em dizer que está tendo aula, mas praticamente não tem aluno de manhã e à noite. A meia dúzia que foi pela manhã estava pelo pátio", sustenta a professora Thaís Karina Rodrigues Santos. De acordo com o professor Daniel Bonin Barreto, é bem provável que os eventuais fiquem sem receber por essas aulas dadas.

Solidários ao movimento, os alunos já estão aderindo. A professora Márcia Braga diz que os estudantes a comunicaram que estão cruzando os braços diante da presença dos eventuais, em sinal de protesto. Outros, ainda, estão se retirando após pedir licença.

Em 2015, Geraldo Alckmin promulgou o reajuste do próprio salário em 4,7%. Seus vencimentos passaram de R$ 20.662 mensais para R$ 21.631. No dia seguinte ao anúncio da paralisação, o governador afirmou: "todo ano é essa novela".

Os próximos dias prometem mais capítulos. Hoje, por exemplo, tem um: alunos da Escola Estadual Heitor Guimarães Côrtes programaram protesto para as 12h, em frente à unidade escolar. Na quinta-feira, dia 26, acontece outro: às 13h30, na praça Matriz, com passeata rumo à Diretoria Regional de Ensino.

Abraços,
Murilo

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