segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Ensaio sobre a seca

Num cenário em que o fim da água não é mais uma questão de "se", mas de "quando", a literatura e a história anunciam que é também a civilização que está sob o risco de extinção


Foto: Patricia Stavis

Em Ensaio sobre a Cegueira, José Saramago testou os limites da existência num romance de tirar o fôlego, não apenas pela heterodoxia na escrita, mas pelo atestado de provisoriedade da civilização, fadada à barbárie pela cegueira que rapidamente contamina toda a população mundial, à exceção de uma mulher. Neste mundo, os diagnosticados são isolados em abrigos subterrâneos, até que a superlotação e a precariedade os tornam insustentáveis. Com a evolução do quadro, cada um dos valores civilizatórios passa a ruir apocaliticamente, como se fossem recentes e supérfluas invenções: democracia, altruísmo, razão. Nada disso serve neste mundo onde a luta pela sobrevivência adquire o modus operandi de um período paleolítico que volta com requintes de crueldade. Estupros, tortura, sequestros e assassinatos tornam-se a regra das relações de poder dos grupos.

Ainda que obra da ficção, o romance do escritor português não está distante das experiências caracterizadas pela falta. Tornamo-nos mais dóceis à medida que controlamos a natureza o suficiente pra que ela não nos destrua, instantaneamente ou por inanição. Ao menor sinal deste descontrole, abrem-se as portas para o caos.  

20 anos depois de Saramago, a serenidade do interior paulista dá lugar a um verdadeiro cenário de guerra: assaltantes por todo lado, escolta armada para os veículos que chegam, agressões, cheiro de fezes alastrado pelas ruas e muito medo. Outrora lembrada pelo excesso, Itu tornou-se a capital da falta. Não mais os pitorescos objetos gigantes espalhados pela cidade, mas a maior crise de abastecimento de água da história que hoje marca seus 160 mil habitantes nos noticiários do país.

Não apenas Itu, mas São Paulo vive uma crise hídrica sem precedentes. Em todo o estado, 44% da população relatou já ter sofrido com a falta d'água. Na capital, o índice sobe para 71%. Bem por isso é possível afirmar que, como sugeriu Eliane Brum, o termo "crise" já não seja mais suficiente pra descrever o cenário que hoje se apresenta, mas já foi quando a escassez não passava de uma projeção aparentemente ficcional. "A crise de água que a Grande São Paulo vive hoje não é a primeira nem será a última. Por causa de limites naturais na disponibilidade hídrica, da poluição de rios e represas, da ocupação desordenada de mananciais, do descaso no uso e da falta de políticas eficientes para reeducar o consumo e reduzir perdas, a região só tem água garantida até 2010", é o que diz matéria de 2003 da Folha de S. Paulo. O governador era Geraldo Alckmin.

Em 2001, o então secretário Antônio Carlos de Mendes Thame reconhecia a possibilidade de colapso do Sistema Cantareira, que operava a 32% da sua capacidade. Sob a tutela de José Serra, em 2009, o governo do estado encomendou um estudo sobre o abastecimento de água e a paisagem é tenebrosa:erial jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,estado-de-sp-ja-previa-desabastecimento-em-estudo-de-2009,1626751O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei.  compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,estado-de-sp-ja-previa-desabastecimento-em-estudo-de-2009,162675"Por volta de 2015, a crise atingiu também a Bacia Hidrográfica dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí", diz o texto, com o narrador postado no ano de 2020. Neste período, ainda, haveria um "conflito pelo uso dos recursos hídricos, que desencadeou uma 'guerra da água' entre algumas regiões. [...] A Agência Nacional de Águas (ANA) disponibilizou técnicos que auxiliaram na mediação do conflito. No auge da crise, prefeitos e vereadores aprovaram pacotes com leis restringindo temporariamente atividades econômicas de uso intensivo de água”.

De acordo com o documento, este é o "cenário de referência". Ou seja, o que "ocorrerá caso sejam mantidas as percepções atuais da evolução do presente. Matematicamente, é considerado o mais provável de ocorrer". Isso tudo imaginado em 2009, por especialistas contratados pelo governo responsável pelo abastecimento de água. O problema é que, além dos investimentos, medidas de economia esbarram no risco de transtornos políticos. 

Em janeiro do ano passado, a Sabesp encaminhou ao Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo uma proposta branda de rodízio somente para as áreas abastecidas pelo sistema Cantareira. Há um ano, seria possível reduzir significativamente os impactos do colapso com um revesamento de 2 dias com e apenas 1 dia sem água - hoje a proposta é de 5 dias sem água e 2 dias com. Mas 2014 era ano de eleição.

Houve quem apostasse que o colapso hídrico seria decisivo para reverter o quadro favorável à reeleição do governador Geraldo Alckmin. Ledo engano: com mais de 12 milhões de votos, o pleito foi decidido já no 1º turno com uma folga invejável - quase 8 milhões a mais de votos que a aposta milionária do PMDB no estado, o maior executivo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf. Passadas as eleições, a aprovação do tucano atingia quase metade da população do estado, apesar das crises também na segurança pública e na educação. Apesar das interrupções de fornecimento, Alckmin sustentou durante toda campanha que não faltou e nem faltaria água para o estado.

Em perfil publicado na revista piauí do último novembro, Julia Dualibi chamou de "efeito teflon" esta capacidade de descolamento de Alckmin dos maiores problemas que o estado enfrenta. Em relação à água, isso se dá graças à baixa percepção de atribuição de responsabilidades: antes do início da campanha, em 2014, somente 37% dos paulistas do interior culpavam Palácio dos Bandeirantes pela escassez. Hoje, 42% dos paulistanos atribuem a crise à falta de planejamento do estado; 29% incorporaram o discurso oficial da falta de chuvas; 3% culpam o desmatamento da Amazônia; e 61% responsabilizam a Sabesp - o que não significa que a gestão da empresa seja relacionada a Alckmin.

Com o agravamento da crise, o governo tem tentado se dissociar da estatal. Já em fevereiro, quando a Sabesp não assumia problemas no abastecimento, mas a "redução drástica dos níveis no reservatório da Cantareira", provocada pelo "calor e a falta de chuvas recordes", o logotipo do governo do estado sequer aparece na campanha que procura incentivar medidas domésticas de economia. Em 2012, Fernando e Sorocaba embalaram o hit "A Casa Caiu", numa bem-humorada campanha de verão contra o desperdício, com direito a ator de touca e até patinho de fantoche com barulho de borracha. Ali, a marca d'água (que ironia do destino) do governo estadual permanece durante toda a peça no canto superior da tela e é apresentada lado a lado com o logo da Sabesp, ambos citados pelo locutor ao final da veiculação. Só num semestre de 2014, a companhia gastou R$ 53 milhões em publicidade.

Foi partir de 2013 que a ficção passou a se cruzar com a realidade. Os racionamentos não-oficiais começaram a acontecer sem aviso prévio ou planejamento e a distribuição passou a ser periodicamente cortada no verão, sobretudo em regiões periféricas e durante a madrugada. 

Mas nada chegou perto do que houve em Itu. Moradores apedrejaram a Câmara de Vereadores em setembro. No mês seguinte, queimaram contêineres em protesto. Para enfrentar a seca, a população passou a adotar hábitos degradantes, como tomar banho de caneca, dar descarga uma vez a cada 3 dias e abandonar de vez a louça na pia. Para encher um galão, são necessárias diversas passagens pela mesma fila. Caminhões-pipa da concessionária Águas de Itu são alvo de emboscadas e um de seus motoristas já foi espancado. Moradores que discutem com valentões que desrespeitam as regras de coleta são agredidos. Assaltos à mão armada nas bicas já não são mais novidade. Em Araçatuba, uma motorista tentou atropelar uma mulher que lavava a calçada: "Você está louca? Está acabando com a água do mundo!", justificou.

Os danos não param por aí. Em escolas municipais de São Paulo, alunos foram proibidos de escovar os dentes. Restaurantes da capital deixaram de lado o aspecto luxuoso para adotar o uso de pratos e talheres descartáveis. Com a tendência de acúmulo de água limpa nas casas, a crise hídrica pode ser o principal fator responsável pelo aumento de 57% dos casos de dengue em relação ao ano passado. Hoje, o Brasil vive um conflito por água a cada 4 dias.

A seca gerou um mercado milionário. Números mais abrangentes ainda são desconhecidos, mas distribuidores que operam com caminhões-pipa afirmam ter aumentado em até 50% a demanda pelos serviços. Em alguns casos, os preços inflacionaram em mais de 100%. A venda de caixas d'água subiu 600% na capital. Nada de anormal para um serviço que há muito tempo deixou de ser considerado direito básico para tornar-se símbolo de privilégio e de muito lucro. Apesar de estatal, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo abriu seu capital para investimentos em 1994, em acordo com a tendência neoliberal de mercantilização dos serviços públicos.

De acordo com ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal e pelo Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual de São Paulo, o colapso anunciado no abastecimento é resultado direto da escolha do governo e da Sabesp pelo mercado financeiro. Desde 2004, quando recebeu a outorga para a exploração do Cantareira, a companhia faturou 12 bilhões de reais. R$ 4 bilhões foram para os acionistas. Entre 2012 e 2013, os lucros bateram recordes e 73% saíram do Cantareira. Enquanto anuncia medidas punitivas para o consumo doméstico, a companhia mantém contratos que premiam grandes consumidores corporativos com descontos progressivos na conta: quanto mais consomem, menos pagam pelo metro cúbico de água.

O relatório dos promotores Alexandra Facciolli, Geraldo Navarro Cabanas, Ivan Carneiro Castanheira e Rodrigo Sanches Garcia, e do procurador da República Leandro Zedes Lares Fernandes, indica que faltaram investimentos para impedir a sobrecarga do principal sistema de abastecimento à Grande São Paulo. O documento lembra que a outorga estava condicionada à elaboração de estudos e projetos que viabilizassem a redução de dependência do Cantareira, o que nem de longe aconteceu. Em 10 anos, nenhum novo sistema foi criado e a demanda por água só aumentou.

Também são alvo da ação a Agência Nacional de Águas e o Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo. Ao que tudo indica, a culpa não é mesmo de São Pedro, como enfatizou a relatora da ONU no ano passado.

Para não racionar a distribuição de água do Cantareira para as 6,2 milhões de pessoas abastecidas na Grande São Paulo, em maio de 2014 o governo do estado anunciou a utilização do "volume morto", que é como se chama a água localizada abaixo das comportas de captação nos reservatórios. Com o fim da 1ª cota, hoje o sistema já utiliza, desde novembro, uma 2ª, com cerca de 105 bilhões de litros. Técnicos da Sabesp já anunciaram mais 81 bilhões de litros utilizáveis recentemente descobertos nas cotas 3 e 4. O problema desta solução mágica é que, quanto mais profunda a água, mais turva ela é, e mais caro e complicado é o seu tratamento. 

No início do ano, Alckmin avisou que deve intensificar os estudos para utilizar a água da Billings para conter a crise. A represa é velha conhecida dos ambientalistas pelo excesso de metais pesados e poluentes orgânicos persistentes. Em 1996, o então governador Mário Covas assinou uma resolução que permite o despejo de água contaminada na Billings com origem no rio Pinheiros, que recebe boa parte do esgoto residencial e industrial da capital.

Às vésperas da eleição, causou alvoroço o vazamento do áudio de uma reunião da Sabesp em que Paulo Massato, diretor metropolitano da companhia, manda todo mundo sair de São Paulo: “Essa é uma agonia, uma preocupação. Alguém brincou aqui, mas é uma brincadeira séria. Vamos dar férias [inaudível]. Saiam de São Paulo, porque aqui não tem água, não vai ter água pra banho, pra limpeza da casa, quem puder compra garrafa, água mineral. Quem não puder, vai tomar banho na casa da mãe lá em Santos, Ubatuba, Águas de São Pedro, sei lá, aqui não vai ter.”

Noutra gravação, a presidenta da empresa, Dilma Pena, critica a irresponsabilidade do governo ao não permitir uma comunicação mais honesta com a população sobre o problema: “A gente tem que seguir orientação… A orientação não tem sido essa, mas é um erro. Tenho consciência absoluta e falo para pessoas com quem converso sobre esse tema, mesmo meus superiores, acho um erro essa administração da comunicação dos funcionários da Sabesp, que são responsáveis por manter o abastecimento, com os clientes”, afirmou. “A Sabesp tem estado muito pouco na mídia, acho que é um erro. Nós tínhamos que estar na mídia, com os superintendes locais, nas rádios comunitárias, Paulo [Massato] falando, eu falando, o Marcel falando, todos falando, com um tema repetido, um monopólio: ‘Cidadão, economize água’.”

Neste mês, o governador José Melo virou notícia em rede nacional ao afirmar que a água do rio Amazonas poderia ser utilizada como solução pra crise no Sudeste. E muita gente levou a sério.

Desorientada, a população tem poucas opções para onde correr diante da inoperância das autoridades e da conivência da imprensa. Iniciativas espontâneas começaram a preencher este vazio: assembleias populares, debates e encontros de novas lideranças têm se voltado ao tema. Criado em outubro, o Boletim da Falta d'Água, administrado pela psicóloga Camila Pavanelli de Lorenzi, tem sido a principal referência no estado. 

Em meio à agenda de protestos, seminários e a tese de doutorado em que está trabalhando, Camila me recebeu pra uma entrevista exclusiva com o blog Desafinado. Apesar da grande repercussão do tumblr e crescimento geométrico de seguidores nas redes sociais, é cética em relação ao poder de transformação da sua atuação, comparada à força política da Sabesp e do governo do estado: 

Em entrevista à Eliane Brum, você disse que a falta d'água é negada quase como defesa psíquica e a crise - se é que podemos chamar o cenário desta forma - ainda não foi encarada como deveria porque as pessoas se negam a acreditar que realmente a água vai acabar. Desde o Boletim da Falta d'Água e sua grande repercussão, é possível dizer que hoje esta letargia está sendo revertida? 

Camila - Não, e muito pelo contrário. O compreensível "desejo de não-saber" da população continua a ser plenamente realizado pelo governo do estado. A Sabesp publica diariamente em seu site um gráfico que mostra haver mais água no Cantareira hoje do que em 2014, o que é - não há outra palavra - uma mentira. A imprensa, por sua vez, repercute essa mentira acriticamente. A repercussão do Boletim da Falta d'Água em SP é insignificante perto do poder de comunicação do governo do estado, da Sabesp e da imprensa.

Mas desde que o Boletim ganhou projeção, uma série de mobilizações foi desencadeada - muitas delas motivadas por ele. Você inclusive tem participado de seminários e grupos de debate. Quais têm sido as suas impressões a respeito destes encontros?

Camila - Sinto que as pessoas têm uma necessidade imensa de falar e de serem ouvidas. Sinto que há um desejo enorme de agir, de ajudar, de "fazer alguma coisa", mas sem que se saiba direito por onde começar. Sinto uma tremenda desconfiança em relação aos governantes e à imprensa. Sinto uma grande necessidade de liderança e de orientação. 

No início do mês, um morador entregou um copo com água suja, colhida da própria torneira, para um vereador durante a sessão na Câmara de Itu. Este evento não ajuda a refletir a distância entre a realidade do problema e os meios para resolvê-lo? 

Camila - Gostei muito do que o morador fez, na verdade. O vereador a quem ele entregou a água é do mesmo partido do prefeito (PSD) e defende a atuação da concessionária Águas de Itu. O gesto me pareceu tão interessante quanto o das meninas que ergueram um cartaz de "Cadê a Água" ao posar para uma foto com Alckmin (veja o registro aqui). Tenho a maior admiração por quem consegue denunciar a hipocrisia através de um simples gesto. Eu só sei escrever textão.

Por outro lado, é visível o descolamento, mesmo intencional, do governo do estado em relação à crise, especialmente desde o ano passado. O que as suas pesquisas têm indicado sobre isso?

Camila - Ontem mesmo (19/02), a Folha fez a pergunta "O governador Alckmin é culpado pela crise hídrica em São Paulo?" a dois colunistas diferentes, tratando-a como um "tema controverso" que admite respostas diferentes. O mero fato de que o jornal trate a responsabilidade de Alckmin pela crise como um assunto "polêmico" e não como o ponto de partida inevitável para qualquer afirmação subsequente já mostra o quanto estamos distantes de uma discussão séria sobre o assunto.

Você acredita que esta crise sem precedentes pode trazer alguma lição às políticas públicas no país? Ou o "efeito teflon" sobre o governador só atesta que esta pode ser uma expectativa muito distante da realidade?

Camila - Não tenho condições de prever nada: só o que posso fazer, assim como todos os cidadãos, é atuar para que políticas socialmente justas sejam implementadas.


No Ensaio sobre a Cegueira, a visão é recuperada aos poucos por cada um dos sobreviventes da epopeia. Resta saber o que será de nós no momento em que o fim da água, pelo menos na capital, já não é mais uma questão de "se", mas "quando". Aliás, é inevitável imaginar como isso vai acontecer. E como desta vez vamos reagir à falta. A literatura e a história dão spoilers.

Abraços, 
Murilo

4 comentários:

  1. O seu nível de discussão está acima da maioria das matérias que temos nos grandes jornais, pois da o tom de seriedade e consciência que o tema pedi, sem esconder ou fazer conluio para a sobrevivência de instituições acima da população. Como não existiu a seriedade para o tema, ao qual o Estado de São Paulo, junto com suas instituições, não tomaram medidas preventivas e educacionais por muitos anos, transformando atos preventivos em emergências (individuais, coletivos, institucionais), que deveriam existir desde que o eixo econômico foi escolhido, o que assistimos é o fato de, quando a água não bater mais na bunda, a barbárie se concretizar. O problema é que o Estado só pensa em sua própria sobrevivência e, pelo tom de seu texto, não só é tarde mas desvia e joga toda a responsabilidade e culpa para a população, através de um retórica diária, alimentada com discursos inocentes todos os dias na tv, enquanto ainda faz o privilégio para alguns (foi mapeado que certas instituições privadas, mesmo com a crise, pagavam menos de 50% do custo do uso da água).

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  2. Ontem, o que seria o ode ao apelo pelo individual responsável que cobra das instituições, para prevalecer está última, o comentarista rechaçou o exemplo do morador sem água, colocando-o como se fosse um egoísta, ao qual só está exigindo seus direitos e pendido mais responsabilidade pelas instituições, mas como você quer exigir se toda a população está também sem água (aproximando-se da fala do programa). Sua escolha por Saramago é crucial, pois o próprio autor realmente mapeia o comportamento no seio da sociedade burguesa em tempos de crise. No meio dela, até mesmo os comportamentos mais louváveis pelas instituições burguesas, são rechaçados, pois só o são uteis quando o são em função da sobrevivência e manutenção das próprias instituições. Assim, seu texto está muito à frente, pois problematiza, seja para qual sujeito for, o quanto é frágil as respostas para essa crise através de modelos que no seio dessa sociedade burguesa não conseguiram resolver, seja os mais clássicos ou aqueles mais humanitários, pois do resto é só esperar pela barbárie, pois a crise está intimamente relacionada com o modo como o sistema se constituiu, enquanto que o estado e suas instituições julgaram e julgarão como culpados e responsáveis a própria população, seguindo o que agora faz pelos jornais e pela tv na sua tentativa sofistica de sobrevivência da imagem das instituições.

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  3. Com isso, continuando, me pergunto se isto não será mais antigo? Lydia Fagundes Telles dizia que a tragédia vem de longe e por isso o tema da verdade é tão pertinente, será que no modelo econômico, ao qual privilegiou São Paulo por todos esses anos em detrimento das outras regiões do país, não fez o próprio Estado entrar em colapso? Na ânsia por sobreviver à todo custo o Estado e suas Instituições parece que não existirá espaço para ações contundentes, pois não se aceitará o fato que o modelo adotado por tantos anos, sem responsabilidade, conduziu ao colapso. Parece que o que está em jogo é a tentativa à todo custo da sobrevivência da ideia que São Paulo é a locomotiva do país e que seu modelo de gestão econômica é referência, que é o estado mais rico e mais culto... mas não fracassou? Em meio a barbarie que se instaura, parece que a tomada de consciência desse fracasso só se dará nos últimos momentos, quando é tarde de mais, igual a qualquer tragédia grega... Murilo, seu texto realmente é muito pertinente!

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