sábado, 28 de fevereiro de 2015

A importância do uniforme escolar

A implantação do uniforme escolar na rede municipal de ensino de Itararé e as mazelas da “imprensa” local 

por OSVALDO RODRIGUES JUNIOR

Foto: Imprensa Oficial de Itararé

Começou na última quarta-feira, 25/02, a entrega do kit de uniformes escolares para os alunos da Rede Municipal de Itararé. O kit, composto por uma camiseta, uma calça e uma jaqueta, foi entregue pela prefeita municipal em 10 (dez) escolas. Nas demais, ficou a cargo dos gestores da escola a distribuição do uniforme. Foram investidos R$ 348.444,44 na uniformização das crianças. Tal melhoria foi possível pela alteração da Lei Municipal nº 2806, de 10 de julho de 2003. Esta lei dispunha sobre a padronização e o uso de uniformes escolares na Rede Municipal de Ensino. No artigo 4º, a lei determinava que apenas os alunos carentes, com famílias de renda per capita igual ou inferior a 65% do salário mínimo, teriam direito ao benefício. A lei municipal nº 3594, de 04 de junho de 2014, suprimiu o artigo 4º e permitiu à prefeitura uniformizar todos os 6.200 alunos da rede municipal de ensino. 

A história dos uniformes escolares remete ao ano de 1890, quando as professoras da Escola Normal adotaram a vestimenta padronizada. Nas décadas de 20 e 30 o uso de uniformes passou a ser estimulado nas escolas mais tradicionais do país. Porém, foi com a democratização do ensino nas décadas de 40 e 50 que os uniformes se transformaram em costume nas escolas públicas e privadas no Brasil. Em 1960, nos debates realizados na 1ª Convenção em defesa da escola pública, que sistematizou as discussões para a Lei de Diretrizes e Bases nº 4.020, de 20 de dezembro de 1961, a preocupação com o uso do uniforme escolar já estava presente em uma emenda: “pela assistência aos alunos que dela necessitarem, sob forma de fornecimento gratuito, ou a preço reduzido, de material escolar, vestuário, alimentação e serviços médicos e dentários” (p. 88). 

Apesar de ser um elemento extremamente sedimentado na cultura escolar, o uso do uniforme escolar suscita debates e possui argumentos favoráveis e contrários. O principal argumento contrário é o de que o uniforme tira a individualidade dos alunos em fase de escolarização. Apesar disso, educadores e até jovens defendem a eficácia e importância do uniforme escolar. Dentre os aspectos positivos para o uso, estão: praticidade, preservação da infância, inibição do consumismo, minimização da vaidade, economia, redução do risco de bullying, segurança na hora do brincar, imposição da disciplina, equilíbrio das diferenças sociais e desenvolvimento da responsabilidade. 

Por todos esses motivos a iniciativa tem sido muito bem aceita por gestores, professores e, principalmente, pais de alunos. Apesar disso, o semanário “A minúscula” publicou uma “matéria” com o título “Prefeitura de Itararé distribui o famoso kit escolar gambá”. Com esta chamada sensacionalista e desrespeitosa, o responsável pela matéria afirmou que o kit será obrigatório para a permanência do aluno nas escolas e que isso não permitirá a higienização do mesmo, assim os alunos vão acabar exalando odores nas escolas municipais. 

O primeiro erro da “notícia”, se é que podemos levar a sério uma informação com este teor, diz respeito ao desconhecimento da lei e, mesmo, do que foi determinado pela Prefeitura Municipal. No evento oficial realizado no Teatro Sylvio Machado, na sexta-feira, 20/02, a prefeita municipal Cristina Ghizzi afirmou que “o uso do uniforme é importante, mas o fato da criança não estar com ele não impedirá o acesso e permanência dos alunos a escola”. A fala da chefe do executivo vai na direção do inciso I do art. 206 da Constituição Federal de 1988, que indica que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Desta forma, o veículo “desinforma” o cidadão itarareense, dando a entender que o executivo teria determinado uma prática inconstitucional, o que é uma mentira. 

A segunda informação incorreta é a de que as malharias locais não estariam recebendo os pedidos de confecção dos uniformes. Em consulta aos comerciantes locais, tivemos a confirmação de que apenas uma das malharias está confeccionando 200 camisetas encomendadas pelos pais dos alunos. 

O terceiro fato a ser destacado é o de que o uso contínuo do uniforme geraria a falta de higiene dos alunos. Esta informação também é inverossímil. Isso porque, no mesmo evento, a Secretária de Educação, Maria Aparecida Damásio Vieira, e a prefeita municipal indicaram que os gestores escolares têm total autonomia para isentar o uso durante um dia da semana para que o kit possa ser higienizado. Desta forma, o uso deve ser delimitado a 4 dias da semana. 

Mais uma vez, parte da imprensa local cumpre o papel que vem sendo dela há 2 anos, o de desinformar e desconstruir sem construir absolutamente nada, como já indicou a colega Luisa Coquemala, em brilhante participação publicada no blog em janeiro. 

Enquanto educador e cidadão itarareense, tenho plena consciência da necessidade da administração municipal trabalhar em prol da cidade e equalizar problemas ainda existentes, porém também de defender uma iniciativa que tem como objetivo trazer bem-estar aos alunos e às famílias dos alunos da rede municipal. Mais do que isso, fortalecer a rede municipal de ensino, que tem atingido ótimos resultados, se transformando em modelo na microrregião em que estamos situados. 

Abraços, 
Osvaldo. 

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Crises, colapsos e revoluções

por LUIS FELIPE MACHADO DE GENARO



Crise. Hoje, talvez, seja essa a palavra que mais nos inculquem através da grande mídia. Crise na Petrobrás, crise econômica, crise de representação, crise nas escolas, entre tantas outras crises Brasil a fora – que dirá no restante do mundo. Estaria a mídia inculcando, transmitindo ou potencializando uma conjuntura realmente crítica? Ninguém sabe ao certo. 

Afinal, estaríamos à beira de um colapso generalizado? Caso a resposta seja categoricamente “sim”, quais seriam as soluções para tamanho banho de incertezas? Certa vez, o ilustre intelectual alemão Walter Benjamin alertou: “a consciência desesperadamente lúcida de estar em meio a uma crise decisiva é crônica na história da humanidade”. Estaria ele correto? 

O Brasil, nas últimas semanas, vem parecendo um caldeirão fervente prestes a explodir. E não é para menos. Contra o “pacote de maldades” do governador Beto Richa, por exemplo, a categoria de professores iniciou uma das mais belas mobilizações do Paraná. Estado sulista com fama – e que fama! – de ser bastante conservador. 

Em Santa Catarina e outras regiões, a greve dos caminhoneiros param estradas e rodovias. Sejam quais forem as ações e reações do movimento, ele está acontecendo. Em São Paulo, a falta d'água parece, aos poucos, incomodar uma população que há décadas escolhe o masoquismo como fetiche eleitoral. Certo é que faltará água para uns, e não para outros. Nem vou começar a falar do avanço das ideias fascistas ou da situação das favelas, como da Maré, em constante pé de guerra, dos camponeses em Rondônia e das diversas tribos indígenas no Mato Grosso. Caos, apenas. 

O governo federal, do Partido dos Trabalhadores, não fica para trás. Através do “ministro dos banqueiros”, Joaquim Levy, Dilma Rousseff escolheu apunhalar fundo nas classes média e baixa, pegando leve com os endinheirados. As medidas fiscais tomadas pelo Palácio do Planalto, segundo Carta Capital, começarão a dificultar “o acesso ao seguro-desemprego, ao abono salarial, à pensão por morte, ao auxílio-doença e ao seguro-defeso pago aos pescadores no período de proibição da sua atividade”. Enquanto Veja dobrava os joelhos pela escolha da presidente, Carta a rechaçava. Incômodo. 

Sem dúvida alguma estamos em crise. Sim, estamos mesmo. A crise das crises, diria. Generalizando – o que muitas vezes pode ser um grave problema –, a classe política brasileira dá de ombros para seus representados. Eduardo Cunha, então, mostra sua bunda branquinha e promove cultos evangélicos estrondosos na Casa (Laica?) do Povo. Festança boa é o que não falta. 

O capital financeiro parece ter sugado entranha por entranha de cada membro do Senado, Câmara de Deputados e Legislativos e Executivos a fora. Sujeitos e partidos políticos pequenos, mas combativos, parecem sumir perante o oceano das bancadas, empresas, corruptos e corruptores. Sublinhemos: tamanha desfaçatez não é como almejam muitos, invenção recente de PT, PSDB, DEM e outros tantos. Parafraseando nosso saudoso Darcy Ribeiro, a crise no Brasil não é uma crise, é um projeto. 

O país foi fundado – leia-se colonizado brutalmente – com base na exploração, na violência de poucos contra muitos, na manutenção de privilégios para uns e migalhas para o resto. Tentativas de rompimento com o que foi construído através dos séculos não faltaram. Hoje, percebemos que essas mesmas estruturas parecem de difícil desmonte. Darcy, então exilado no Uruguai, escreveria esperançoso: “Velhas questões institucionais, não tendo sido resolvidas nem superadas, continuam sendo os principais fatores de atraso e, ao mesmo tempo, os principais motores da revolução social”. Ministra Abreu e sem-terras, assim mesmo, nessa ordem, que o digam. 

Há quem, no momento de crise, permaneça crente aos “heróis” do passado, às tradições nacionais e ao sectarismo violento. Tudo, como reza a bandeira verde e amarela, para manter a ordem e o progresso. Traduzindo: permanecem de mãos dadas com os poderosos de sempre. O fluir disso tudo desemboca em “protestos” nas ruas ao som do hino nacional, contra as estrelas e ideais vermelhos. “Vão pra Cuba”, bradam as senhorinhas. 

Por outro lado – o que é lamentável – a tão sonhada revolução social permanece apenas nos sonhos de um e outro socialista convicto. Aos menos é o que se observa. Por favor, não me comentem aqui no blog sobre a construção de um Estado Socialista-Cubano-Bolchevique-Lulista-Brasileiro. Ah, e aos que não estão sabendo que o Muro de Berlim desabou em meados de 90’, bom... 

Sim, uma revolução social consciente, violenta e mobilizadora para que, finalmente, viremos o jogo. Essa é a ideia. Movamos as peças deste tabuleiro arcaico. Já não podemos aceitar um abismo social, racial e econômico tão natural aos olhos. E se o assunto é a crise das crises, finalizo com a constatação fulminante de Rob Riemen: “a classe dominante nunca será capaz de superar a crise. Ela é a crise!”. Só uma coisa parece estar certa: precisamos enfim superá-la. Como? Precisaremos redescobrir. 

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

A falência do estado do Paraná

Como Beto Richa conseguiu “quebrar” o Estado do Paraná e entrou em rota de colisão com os servidores públicos estaduais 

por OSVALDO RODRIGUES JUNIOR

Foto: Gazeta do Povo
No dia 9 de fevereiro os professores da Rede Estadual do Paraná entraram em greve no estado. Os motivos foram o calote nos professores contratados e efetivos e o “pacotaço” apresentado por Richa para votação na Assembleia Legislativa do Paraná. 

O “pacotaço”, revestido do discurso de “medidas de austeridade”, propunha retirar diversos direitos trabalhistas dos servidores estaduais, principalmente dos servidores da Educação. Dentre eles cortes no auxílio transporte, nos aumentos salariais por tempo de serviço, no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), além de uma mudança de regime na aposentadoria dos servidores. Para isso, o governo propunha a extinção do Fundo Previdenciário da Paraná Previdência e a criação da Fundação PREVCOM Paraná. Dessa forma, o teto máximo passaria a R$ 4.600 mensais e os servidores teriam que pagar um fundo complementar além dos 11% retidos no salário. Todas as medidas somadas ao aumento das taxas de IPVA, em 40%, e do ICMS da gasolina, de 28% para 29%, foram tomadas para “sanar” as dívidas contraídas pelo governo Richa nos 4 (quatro) anos de mandato. 

O “freio de arrumação” citado pelo governador em entrevista à rádio CBN propositadamente não foi anunciado no período eleitoral em que Richa utilizou do “estelionato eleitoral” para vencer as eleições no 1º turno. Apesar do discurso, a realidade do estado é outra, chegando o secretário da fazenda, Mauro Ricardo da Costa, a afirmar que o Estado está “contando os centavos”

Para além do discurso é fundamental compreendermos que uma dívida tem uma origem e um ou vários motivos. No caso de Richa, a inegável irresponsabilidade com os gastos públicos no primeiro mandato. Os gastos com publicidade, um dos elementos preponderantes para o “alto índice” de aprovação do governador, cresceram 376,4%. Porém, o principal gasto no primeiro mandato está relacionado aos gastos com “pessoal e encargos sociais”. Por mais que tenha caído no geral de 49,89% em 2011 para 42,77% em 2014, Richa aumentou em 177% os gastos com funcionários comissionados, passando de R$ 113 milhões para R$ 313,5 milhões já no primeiro ano de mandato. Em 2014, ano eleitoral, o gasto chegou à casa dos R$ 507 milhões. Neste caso, uma crítica feita constantemente pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB - ao Partido dos Trabalhadores – PT - pode ser aplicada ao governador tucano, pois os números evidenciam a prática de “aparelhamento do Estado”. Além de tudo isso, o governador investiu 1,4 bilhões por ano dos cofres públicos para amortização da dívida pública, privilegiando, como em todos os modelos neoliberais de gestão, os banqueiros em detrimento da população. 

O mais indignante é que o estado do Paraná sofreu um aumento de 49,53% de crescimento acumulado das receitas correntes líquidas (receitas correntes descontando as deduções, no caso o FUNDEB). Com esses números, o Paraná foi uma dos estados com o maior crescimento de receitas no período. Isso permite afirmar que o governador foi no mínimo irresponsável com os gastos públicos, permitindo ao estado se afundar em uma crise sem precedentes. Alheio à crise o governador anunciou uma licitação no mínimo inapropriada no valor de R$ 1,13 milhão para aluguel de oito carros Sedan 3.0, sendo dois blindados. Os carros serão para uso da equipe de governo de Beto Richa. 

Imagem: Portal da Transparência do Paraná

O governador reagiu à greve e, mais especificamente, ao movimento de servidores da Educação que invadiu e se acampou na ALEP como uma manifestação “absurda e violenta”. Na quinta-feira, 12 de fevereiro, como já se tornou tradição nos governos tucanos no Paraná, os professores foram atacados pela Polícia Militar, que utilizou balas de borracha, gás de pimenta e bombas de efeito moral para tentar dispersar a multidão. Com isso, o governo recuou e retirou da pauta, ao menos por enquanto, o “pacotaço” de maldades, como foi denominado pela imprensa local. Além dos professores e parlamentares de oposição, a Ordem dos Advogados do Brasil também entrou na luta contra as “medidas de austeridade” do governador. 

O rombo de aproximadamente R$ 4 bilhões desencadeou a crise econômica e política vivida pelo estado. Alvaro Dias, então presidente do PSDB, se afastou da liderança do partido e criticou duramente o governador Beto Richa afirmando que o seu governo é marcado pelo “nepotismo, fisiologismo escancarado e loteamento sem escrúpulos engordando a estrutura da administração pública e comprometendo sua eficiência”. 

A crise econômica e política do Paraná escancarou mais uma vez os problemas do modelo neoliberal aplicado à economia e, mais do que isso, das práticas políticas escusas e irresponsáveis assumidas pelos grandes partidos brasileiros na tentativa de manutenção da chamada “governabilidade”. Diante de todo esse quadro, coube aos professores o papel de protagonistas na luta pela manutenção dos direitos sociais e trabalhistas. 

Abraços, 
Osvaldo.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Entre petralhas e tucanalhas. Você conhece o PMDB?

por SANDRO CHAVES ROSSI


"E o petrolão dos petralhas!?". Foi um dos comentários feitos no portal de notícias da Gazeta do Povo, especificamente em uma matéria que falava dos cortes de gastos do governador Beto Richa (PSDB-PR) no sistema público de educação. Não é difícil ver o contrário acontecendo. Pra falar a verdade, é extremamente comum. Mas até que ponto o PT e o PSDB são os grandes vilões da história toda? Bem, que eles não são santos nós sabemos, mas e o PMDB? Você conhece?

O PMDB é o maior partido do Brasil, literalmente. Nas últimas eleições, o PMDB foi o partido que elegeu o maior número de governadores no país, foram 7 no total - RS, RJ, ES, SE, AL, TO e RO. O partido ainda tem a maioria dos prefeitos, vereadores e deputados estaduais no Brasil inteiro. O PMDB conseguiu maioria no senado também. Dos 81 senadores, 19 são do partido. Além do mais, o senado é presidido por Renan Calheiros (PMDB-AL). No congresso, ficou atrás apenas do PT. O PMDB elegeu 66 deputados federais e, assim como no senado, conseguiu a presidência da casa com Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O PMDB ainda conta com 6 ministros no novo governo e a vice presidência da república com Michel Temer (PMDB-SP). O grande problema é que, com uma maioria política, o partido se sente livre para aplicar suas políticas, mesmo não sendo líder do governo federal. É aí que mora o perigo.

Michel Temer já disse que quem dá o tom da política no país é o PMDB. É fácil de ver que o que foi dito pelo vice-presidente é verdade: devido à sua vasta maioria partidária no cenário político brasileiro é fácil de concluir o que algumas pessoas já dizem há algum tempo: ninguém governa sem fazer aliança com o PMDB. Temer ainda disse que essa é realmente a intenção, fazer o PMDB crescer cada vez mais. Isso torna o partido um verdadeiro "catch-all parties" (partido pega-tudo) composto por políticos de diversos segmentos e ideologias, dos mais conservadores até aos mais progressistas. Ainda tem mais: o vice-presidente disse que hoje a intenção do partido é se tornar protagonista de vez e lançar o seu próprio candidato em 2018. O PMDB pode aparecer como uma terceira via nas eleições de 2018 e pode surpreender, visto que os protagonistas da bipolarização PT x PSDB vêm se defasando cada vez mais e perdendo muitos eleitores.


As políticas propostas por alguns dos principais nomes dos partido têm conseguido se consolidar mesmo com as pressões populares contrárias. Atualmente os dois maiores exemplos são o deputado federal e presidente do congresso, Eduardo Cunha, e a ex-senadora e atual ministra da agricultura Kátia Abreu. Cunha propõe seus projetos juntamente com a bancada evangélica, dentre eles estão o projeto que proíbe a adoção de crianças por casais homossexuais e o dia do orgulho heterossexual (sic). Além disso, Eduardo Cunha já se mostrou contrário a algumas pautas da reforma política, como o fim do financiamento privado em campanhas políticas. Eduardo Cunha também teve seu nome citado nas investigações da operação Lava Jato.

Kátia Abreu segue a mesma linha, porém sua decisões são tomadas juntamente a bancada ruralista. A atual ministra da agricultura teve um papel importante em tornar mais "flexível" o Novo Código Florestal Brasileiro, aprovado em 2012, que deu mais facilidades para desmatar áreas nativas para favorecimento do agronegócio. A batalha de Kátia Abreu contra a população indígena também é bastante conhecida: Kátia tenta a todo custo ter um controle mais "rígido" sobre terras indígenas, tentativas que já geraram inúmeros conflitos entre índios e latifundiários - vale lembrar que Kátia Abreu disse que não existem latifúndios no Brasil. Em 2010, o Greenpeace "premiou", na época, a senadora com a "Motosserra de Ouro", coroando-a como a "Miss desmatamento".



Com base em dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) divulgou balanço com os partidos com maior número de parlamentares cassados por corrupção desde 2000. O PMDB ficou em segundo lugar, com 66 políticos cassados, ficando atrás apenas do DEM, que teve 69. Basta dar uma boa olhada nos principais representantes do partido para saber que boa coisa não é. Nomes que vão de Renan Calheiros até o já aposentado José Sarney, além do atual caso da Lava Jato, que mostra a maioria dos envolvidos ligados ao partido. Há quem prefira ficar nessa rixa a de "meu partido rouba menos que o seu", protagonizada por PT x PSDB, porém o buraco é bem mais embaixo.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Decálogo da Pena de Morte no Brasil

“Dura Lex Sed Lex” 

Para Datena Saad, Marcelo Rezende, Jair Bolsonaro e Sheherazade Jequiti 

por SILAS CORREA LEITE*


Como desde 1500 já temos pena de abandono e de miséria absoluta para pobres, os miseráveis excluídos sociais de nossos capitalhordismo americanalhado made in Samparaguai, o estado máfia, como já temos historialmente pena de privação de liberdade e de fome para pobres, pena de insensibilidade assistida para carentes e humildes, e mesmo PENA DE MORTE só para pobres, afrodescendentes, mestiços, índios, mulheres, favelados, sem terra, tem teto, sem amor ou mesmo os sem salário dos Professores da educação pública, e ainda uma sobrevivente ‘gentehumana’ de carentes periferias Sociedades Anônimas, somos a favor da...
 
... PENA DE MORTE PARA TODOS! 

Portanto, brava gente, PENA DE MORTE para... 

01)-Todos os nobres banqueiros que não pagarem juros e correção monetária de igual valor real aos seus clientes depositários fieis, no mesmo quantum que cobraram em seus empréstimos, cartas de oferecimentos de créditos e financiamentos especulativos-lucrativos. 

02)-Para todas as autoridades constituídas que se prostituíram no cargo ou venderam o direito propriamente dito e a justiça oficial, e que por consequência disso e de ilicitudes, arranjos e vantagens pertinentes de labirínticos bastidores, ficaram inapropriadamente ricas com amorais lucros sujos de prevaricação e suspeitos rearranjos sem quarentenas éticas no cargo público. 

03)-Para todos os pomposos juízes marajás que auferindo altos salários não fizeram valer pelo que ganham uma também alta e profícua justiça direta, imediata, dinâmica, objetiva, limpa e correta, não fizeram, portanto, valer o cargo, o status quo, a pose legal e a própria instrumentalização do oficio régio para que a bendita justiça de fato fosse feita a todo custo; que fosse ágil e eficaz para todos no seu propósito, de forma inapelavelmente sem embustes pseudolegais, labirintos jurídicos aéticos, para que assim então fosse mesmo ampla, total e irrestrita. Não queremos mais salários de marajá para justiça de meros tostões, caraminguás... 

04)-Para empresários, especuladores, latifundiários, estrangeiros, autoridades mercantis que não reembolsarem no verdadeiro custo-retorno da mais-valia da força físico-legal com salários honrados, dignos e humanamente eficazes, seus serviçais, subalternos, operários, servos, aias, cunhatãs, mediadores e servidores, ou que venham a cobrar lucros injustos, que visem riquezas ímprobas, com cobranças de taxas, tarifas sazonais, custos inexatos e impostos que não custeiem de fato e com justeza a devida inclusão social e humana na relação capital-trabalho, equilibrando a cadeia produtiva e consumidora 

05)-Para donos e âncoras de meios de produção de comunicação e de diversão por excelência de entretenimento edificante e conciliador, que propaguem o dezelo público, o ódio, a vingança, o humor chulo e irado de irrazão, a revolta o ranço do arbítrio, o regime de exceção, o medo, a intimidação, a mentira, a meia verdade não devidamente transitada em julgado de forma transparente, ou propagação à exaustão com fascismo de notícias tendenciosas e parciais, incompletas, embusteiras, com nefastos interesses escusos, torcendo contra o país. 

06)-Para a composição diretiva de toda religião de má fé que não alfabetizasse inteiramente seus simpatizantes, membros e filiados, ou que em nome de DEUS evoque arbitrariedades pagãs, ou que evocasse práxis enigmáticas a respeito de dogmas medievais, crenças espúrias em falsas santidades disfarçadas de veneração, missas bizarras, cultos díspares ou congregacionismos com embustes de fé, de créditos, como práticas de arapucas mentais, falso-espirituais, financeiras, inquisitórias, fantasiosas ou com fantasmas de lendas ignóbeis e vis. 

07)-Para os dons de todas as instituições de ensino que especulassem com o lucro arbitrário, a ignorância seletiva; todas as universidades e outras unidades de educação que ao final não capacitassem realmente seus formandos a adquirirem ao longo dos cursos, extensões, especializações, mestrados e doutorados, o real conhecimento original da prática ética, da cidadania em busca de um humanismo de resultados de todos para todos, com princípios sociais embasadores de solidariedade e de amor ao próximo. 

08)-Para todo político de ofício, de ramo e de vida pregressa, que desqualifique a família, a sociedade, a arte, a cultura e educação, o próprio conhecimento universal compartilhado com sua postura contrária à filosofia pregada, tese uma, prática outra, ferindo a dignidade social da humanidade com desmandos inumanos, fomentando a ignorância, a usura, a soberba, o autoritarismo vil, a arbitrariedade, a discriminação, o racismo, lucros impunes, riquezas injustas, e o bestialismo de viseira partidária sem fito comunitário e real comprometimento de um por todo e todos sendo um. 

09)-Para supostas excelências de ‘notáveis inúteis’ com saberes ineficazes para o povo, razão de ser do estado, que formarem quadrilhas de clã, de meio ou corporativistas, ou gangues, máfias, carteis, privatizações-roubos, concessões periculosas, estados máfias, lobbys, sucateamento proposital do patrimônio público e associacionismo vicioso, tráfico de influência com benefício próprio ao que deveria ser o digno exercício o poder limpo que emana do povo, e que em seu nome deve ser exercido na teoria e na práxis. 

10)-Por fim, para todos os mal formados, mal informados, incautos sem causa, inocentes de engodos formais, radicais de condomínio fechado, anarquistas de fins de semana em esgoto Miami, e desconhecedores do triste processo histórico da humanidade, quando ocorrem falhas suspeitas do direito, ocorrendo negligência, omissão ou precariedade da justiça, da busca por intermédio dela de um sonho de paz social e democracia social que vise um humanismo de resultados depois do chamado fim das utopias, e então, autoridades, juízes, militares, patentes, graduados, sistema reprodutor como um todo do arcabouço da justiça, membros de forma direta ou indireta da área, e que serão sumariamente apenados também e de presto condenados à pena de morte em caso de inaceitável condenação de um eventual inocente. Deverão ser apreendidos os bens todos do clã, e distribuídos aos familiares das vitima da terrível injustiça quando deveria ser um foro legal. 

Cumpra-se: sob as penas da lei. 

-OBS: Solicita-se às competentes autoridades cumpridoras do dever público a devida construção de cadeias, prisões, penitenciárias de segurança máxima, em área municipal, estadual, regional e federal, para que irremediavelmente todos, de todos os níveis sociais, patentes e poder aquisitivo e grau sociocultural, sendo caçados e possam assim cumprir o mister universal de meritória pena de morte mesmo para todos. 



* Silas Correa Leite é Ciberpoeta, livre pensador humanista, blogueiro (consta em mais de 800 links de sites da web, até no exterior), crítico social, escritor premiado membro da UBE-União Brasileira de Escritores, Jornalista Comunitário, conselheiro diplomado em Direitos Humanos e Democracia, autor, entre outros, de GOTO, Romance, O Reino Encantado do Barqueiro Noturno do Rio Itararé, Editora Clube de Autores, SC; Autor de Pirilâmpadas, Literatura infantojuvenil, RS, Editora Pragmatha, RS; O Menino Que Queria Ser Super-Herói, site Amazon, romance infantojuvenil. E-mail: poesilas@terra.com.br– Site premiado do UOL: www.portas-lapsos.zip.net -Texto da Série “O Brasil Pondo os Pingos no Is dos Vários Brasis Gerais”/Livro em formação do autor. 

ADENDO: 

PS: 

Os ricos podem financiar pecuniariamente as suas próprias cadeiras elétricas com ar refrigerado e estilo neogótico, seus próprios cadeados com senhas em braile feitos pelo neoescravismo neoliberal de Miami, EUA, podem comprar suas próprias e familiares câmaras de gás zen-orgânico com perfume francês de primeiro mundo, podem pagar também suas confortáveis celas térmicas com música de jazz dos anos de glamour no Mississipi, celas de luxo com vistas para o ar e marmitex vegetariano, ou ainda importar soberanas autoridades religiosas de Cuba para assim garbosamente auferirem extrema-unção bilíngue de quilate globalizado a custo honesto que aceita convênio internacional. Não se aceita moedas podres do plano real. Podem também os apenados financiarem banda marcial na execução com data marcada em concorrida agenda de foro turístico conveniado com a CBN-News em 3D. Justiça que não é para todos não é justiça. Pena de Morte só para alguns não é justiça de moral que preste.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Ensaio sobre a seca

Num cenário em que o fim da água não é mais uma questão de "se", mas de "quando", a literatura e a história anunciam que é também a civilização que está sob o risco de extinção


Foto: Patricia Stavis

Em Ensaio sobre a Cegueira, José Saramago testou os limites da existência num romance de tirar o fôlego, não apenas pela heterodoxia na escrita, mas pelo atestado de provisoriedade da civilização, fadada à barbárie pela cegueira que rapidamente contamina toda a população mundial, à exceção de uma mulher. Neste mundo, os diagnosticados são isolados em abrigos subterrâneos, até que a superlotação e a precariedade os tornam insustentáveis. Com a evolução do quadro, cada um dos valores civilizatórios passa a ruir apocaliticamente, como se fossem recentes e supérfluas invenções: democracia, altruísmo, razão. Nada disso serve neste mundo onde a luta pela sobrevivência adquire o modus operandi de um período paleolítico que volta com requintes de crueldade. Estupros, tortura, sequestros e assassinatos tornam-se a regra das relações de poder dos grupos.

Ainda que obra da ficção, o romance do escritor português não está distante das experiências caracterizadas pela falta. Tornamo-nos mais dóceis à medida que controlamos a natureza o suficiente pra que ela não nos destrua, instantaneamente ou por inanição. Ao menor sinal deste descontrole, abrem-se as portas para o caos.  

20 anos depois de Saramago, a serenidade do interior paulista dá lugar a um verdadeiro cenário de guerra: assaltantes por todo lado, escolta armada para os veículos que chegam, agressões, cheiro de fezes alastrado pelas ruas e muito medo. Outrora lembrada pelo excesso, Itu tornou-se a capital da falta. Não mais os pitorescos objetos gigantes espalhados pela cidade, mas a maior crise de abastecimento de água da história que hoje marca seus 160 mil habitantes nos noticiários do país.

Não apenas Itu, mas São Paulo vive uma crise hídrica sem precedentes. Em todo o estado, 44% da população relatou já ter sofrido com a falta d'água. Na capital, o índice sobe para 71%. Bem por isso é possível afirmar que, como sugeriu Eliane Brum, o termo "crise" já não seja mais suficiente pra descrever o cenário que hoje se apresenta, mas já foi quando a escassez não passava de uma projeção aparentemente ficcional. "A crise de água que a Grande São Paulo vive hoje não é a primeira nem será a última. Por causa de limites naturais na disponibilidade hídrica, da poluição de rios e represas, da ocupação desordenada de mananciais, do descaso no uso e da falta de políticas eficientes para reeducar o consumo e reduzir perdas, a região só tem água garantida até 2010", é o que diz matéria de 2003 da Folha de S. Paulo. O governador era Geraldo Alckmin.

Em 2001, o então secretário Antônio Carlos de Mendes Thame reconhecia a possibilidade de colapso do Sistema Cantareira, que operava a 32% da sua capacidade. Sob a tutela de José Serra, em 2009, o governo do estado encomendou um estudo sobre o abastecimento de água e a paisagem é tenebrosa:erial jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei. Para compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,estado-de-sp-ja-previa-desabastecimento-em-estudo-de-2009,1626751O material jornalístico produzido pelo Estadão é protegido por lei.  compartilhar este conteúdo, utilize o link:http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,estado-de-sp-ja-previa-desabastecimento-em-estudo-de-2009,162675"Por volta de 2015, a crise atingiu também a Bacia Hidrográfica dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí", diz o texto, com o narrador postado no ano de 2020. Neste período, ainda, haveria um "conflito pelo uso dos recursos hídricos, que desencadeou uma 'guerra da água' entre algumas regiões. [...] A Agência Nacional de Águas (ANA) disponibilizou técnicos que auxiliaram na mediação do conflito. No auge da crise, prefeitos e vereadores aprovaram pacotes com leis restringindo temporariamente atividades econômicas de uso intensivo de água”.

De acordo com o documento, este é o "cenário de referência". Ou seja, o que "ocorrerá caso sejam mantidas as percepções atuais da evolução do presente. Matematicamente, é considerado o mais provável de ocorrer". Isso tudo imaginado em 2009, por especialistas contratados pelo governo responsável pelo abastecimento de água. O problema é que, além dos investimentos, medidas de economia esbarram no risco de transtornos políticos. 

Em janeiro do ano passado, a Sabesp encaminhou ao Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo uma proposta branda de rodízio somente para as áreas abastecidas pelo sistema Cantareira. Há um ano, seria possível reduzir significativamente os impactos do colapso com um revesamento de 2 dias com e apenas 1 dia sem água - hoje a proposta é de 5 dias sem água e 2 dias com. Mas 2014 era ano de eleição.

Houve quem apostasse que o colapso hídrico seria decisivo para reverter o quadro favorável à reeleição do governador Geraldo Alckmin. Ledo engano: com mais de 12 milhões de votos, o pleito foi decidido já no 1º turno com uma folga invejável - quase 8 milhões a mais de votos que a aposta milionária do PMDB no estado, o maior executivo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf. Passadas as eleições, a aprovação do tucano atingia quase metade da população do estado, apesar das crises também na segurança pública e na educação. Apesar das interrupções de fornecimento, Alckmin sustentou durante toda campanha que não faltou e nem faltaria água para o estado.

Em perfil publicado na revista piauí do último novembro, Julia Dualibi chamou de "efeito teflon" esta capacidade de descolamento de Alckmin dos maiores problemas que o estado enfrenta. Em relação à água, isso se dá graças à baixa percepção de atribuição de responsabilidades: antes do início da campanha, em 2014, somente 37% dos paulistas do interior culpavam Palácio dos Bandeirantes pela escassez. Hoje, 42% dos paulistanos atribuem a crise à falta de planejamento do estado; 29% incorporaram o discurso oficial da falta de chuvas; 3% culpam o desmatamento da Amazônia; e 61% responsabilizam a Sabesp - o que não significa que a gestão da empresa seja relacionada a Alckmin.

Com o agravamento da crise, o governo tem tentado se dissociar da estatal. Já em fevereiro, quando a Sabesp não assumia problemas no abastecimento, mas a "redução drástica dos níveis no reservatório da Cantareira", provocada pelo "calor e a falta de chuvas recordes", o logotipo do governo do estado sequer aparece na campanha que procura incentivar medidas domésticas de economia. Em 2012, Fernando e Sorocaba embalaram o hit "A Casa Caiu", numa bem-humorada campanha de verão contra o desperdício, com direito a ator de touca e até patinho de fantoche com barulho de borracha. Ali, a marca d'água (que ironia do destino) do governo estadual permanece durante toda a peça no canto superior da tela e é apresentada lado a lado com o logo da Sabesp, ambos citados pelo locutor ao final da veiculação. Só num semestre de 2014, a companhia gastou R$ 53 milhões em publicidade.

Foi partir de 2013 que a ficção passou a se cruzar com a realidade. Os racionamentos não-oficiais começaram a acontecer sem aviso prévio ou planejamento e a distribuição passou a ser periodicamente cortada no verão, sobretudo em regiões periféricas e durante a madrugada. 

Mas nada chegou perto do que houve em Itu. Moradores apedrejaram a Câmara de Vereadores em setembro. No mês seguinte, queimaram contêineres em protesto. Para enfrentar a seca, a população passou a adotar hábitos degradantes, como tomar banho de caneca, dar descarga uma vez a cada 3 dias e abandonar de vez a louça na pia. Para encher um galão, são necessárias diversas passagens pela mesma fila. Caminhões-pipa da concessionária Águas de Itu são alvo de emboscadas e um de seus motoristas já foi espancado. Moradores que discutem com valentões que desrespeitam as regras de coleta são agredidos. Assaltos à mão armada nas bicas já não são mais novidade. Em Araçatuba, uma motorista tentou atropelar uma mulher que lavava a calçada: "Você está louca? Está acabando com a água do mundo!", justificou.

Os danos não param por aí. Em escolas municipais de São Paulo, alunos foram proibidos de escovar os dentes. Restaurantes da capital deixaram de lado o aspecto luxuoso para adotar o uso de pratos e talheres descartáveis. Com a tendência de acúmulo de água limpa nas casas, a crise hídrica pode ser o principal fator responsável pelo aumento de 57% dos casos de dengue em relação ao ano passado. Hoje, o Brasil vive um conflito por água a cada 4 dias.

A seca gerou um mercado milionário. Números mais abrangentes ainda são desconhecidos, mas distribuidores que operam com caminhões-pipa afirmam ter aumentado em até 50% a demanda pelos serviços. Em alguns casos, os preços inflacionaram em mais de 100%. A venda de caixas d'água subiu 600% na capital. Nada de anormal para um serviço que há muito tempo deixou de ser considerado direito básico para tornar-se símbolo de privilégio e de muito lucro. Apesar de estatal, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo abriu seu capital para investimentos em 1994, em acordo com a tendência neoliberal de mercantilização dos serviços públicos.

De acordo com ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal e pelo Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual de São Paulo, o colapso anunciado no abastecimento é resultado direto da escolha do governo e da Sabesp pelo mercado financeiro. Desde 2004, quando recebeu a outorga para a exploração do Cantareira, a companhia faturou 12 bilhões de reais. R$ 4 bilhões foram para os acionistas. Entre 2012 e 2013, os lucros bateram recordes e 73% saíram do Cantareira. Enquanto anuncia medidas punitivas para o consumo doméstico, a companhia mantém contratos que premiam grandes consumidores corporativos com descontos progressivos na conta: quanto mais consomem, menos pagam pelo metro cúbico de água.

O relatório dos promotores Alexandra Facciolli, Geraldo Navarro Cabanas, Ivan Carneiro Castanheira e Rodrigo Sanches Garcia, e do procurador da República Leandro Zedes Lares Fernandes, indica que faltaram investimentos para impedir a sobrecarga do principal sistema de abastecimento à Grande São Paulo. O documento lembra que a outorga estava condicionada à elaboração de estudos e projetos que viabilizassem a redução de dependência do Cantareira, o que nem de longe aconteceu. Em 10 anos, nenhum novo sistema foi criado e a demanda por água só aumentou.

Também são alvo da ação a Agência Nacional de Águas e o Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo. Ao que tudo indica, a culpa não é mesmo de São Pedro, como enfatizou a relatora da ONU no ano passado.

Para não racionar a distribuição de água do Cantareira para as 6,2 milhões de pessoas abastecidas na Grande São Paulo, em maio de 2014 o governo do estado anunciou a utilização do "volume morto", que é como se chama a água localizada abaixo das comportas de captação nos reservatórios. Com o fim da 1ª cota, hoje o sistema já utiliza, desde novembro, uma 2ª, com cerca de 105 bilhões de litros. Técnicos da Sabesp já anunciaram mais 81 bilhões de litros utilizáveis recentemente descobertos nas cotas 3 e 4. O problema desta solução mágica é que, quanto mais profunda a água, mais turva ela é, e mais caro e complicado é o seu tratamento. 

No início do ano, Alckmin avisou que deve intensificar os estudos para utilizar a água da Billings para conter a crise. A represa é velha conhecida dos ambientalistas pelo excesso de metais pesados e poluentes orgânicos persistentes. Em 1996, o então governador Mário Covas assinou uma resolução que permite o despejo de água contaminada na Billings com origem no rio Pinheiros, que recebe boa parte do esgoto residencial e industrial da capital.

Às vésperas da eleição, causou alvoroço o vazamento do áudio de uma reunião da Sabesp em que Paulo Massato, diretor metropolitano da companhia, manda todo mundo sair de São Paulo: “Essa é uma agonia, uma preocupação. Alguém brincou aqui, mas é uma brincadeira séria. Vamos dar férias [inaudível]. Saiam de São Paulo, porque aqui não tem água, não vai ter água pra banho, pra limpeza da casa, quem puder compra garrafa, água mineral. Quem não puder, vai tomar banho na casa da mãe lá em Santos, Ubatuba, Águas de São Pedro, sei lá, aqui não vai ter.”

Noutra gravação, a presidenta da empresa, Dilma Pena, critica a irresponsabilidade do governo ao não permitir uma comunicação mais honesta com a população sobre o problema: “A gente tem que seguir orientação… A orientação não tem sido essa, mas é um erro. Tenho consciência absoluta e falo para pessoas com quem converso sobre esse tema, mesmo meus superiores, acho um erro essa administração da comunicação dos funcionários da Sabesp, que são responsáveis por manter o abastecimento, com os clientes”, afirmou. “A Sabesp tem estado muito pouco na mídia, acho que é um erro. Nós tínhamos que estar na mídia, com os superintendes locais, nas rádios comunitárias, Paulo [Massato] falando, eu falando, o Marcel falando, todos falando, com um tema repetido, um monopólio: ‘Cidadão, economize água’.”

Neste mês, o governador José Melo virou notícia em rede nacional ao afirmar que a água do rio Amazonas poderia ser utilizada como solução pra crise no Sudeste. E muita gente levou a sério.

Desorientada, a população tem poucas opções para onde correr diante da inoperância das autoridades e da conivência da imprensa. Iniciativas espontâneas começaram a preencher este vazio: assembleias populares, debates e encontros de novas lideranças têm se voltado ao tema. Criado em outubro, o Boletim da Falta d'Água, administrado pela psicóloga Camila Pavanelli de Lorenzi, tem sido a principal referência no estado. 

Em meio à agenda de protestos, seminários e a tese de doutorado em que está trabalhando, Camila me recebeu pra uma entrevista exclusiva com o blog Desafinado. Apesar da grande repercussão do tumblr e crescimento geométrico de seguidores nas redes sociais, é cética em relação ao poder de transformação da sua atuação, comparada à força política da Sabesp e do governo do estado: 

Em entrevista à Eliane Brum, você disse que a falta d'água é negada quase como defesa psíquica e a crise - se é que podemos chamar o cenário desta forma - ainda não foi encarada como deveria porque as pessoas se negam a acreditar que realmente a água vai acabar. Desde o Boletim da Falta d'Água e sua grande repercussão, é possível dizer que hoje esta letargia está sendo revertida? 

Camila - Não, e muito pelo contrário. O compreensível "desejo de não-saber" da população continua a ser plenamente realizado pelo governo do estado. A Sabesp publica diariamente em seu site um gráfico que mostra haver mais água no Cantareira hoje do que em 2014, o que é - não há outra palavra - uma mentira. A imprensa, por sua vez, repercute essa mentira acriticamente. A repercussão do Boletim da Falta d'Água em SP é insignificante perto do poder de comunicação do governo do estado, da Sabesp e da imprensa.

Mas desde que o Boletim ganhou projeção, uma série de mobilizações foi desencadeada - muitas delas motivadas por ele. Você inclusive tem participado de seminários e grupos de debate. Quais têm sido as suas impressões a respeito destes encontros?

Camila - Sinto que as pessoas têm uma necessidade imensa de falar e de serem ouvidas. Sinto que há um desejo enorme de agir, de ajudar, de "fazer alguma coisa", mas sem que se saiba direito por onde começar. Sinto uma tremenda desconfiança em relação aos governantes e à imprensa. Sinto uma grande necessidade de liderança e de orientação. 

No início do mês, um morador entregou um copo com água suja, colhida da própria torneira, para um vereador durante a sessão na Câmara de Itu. Este evento não ajuda a refletir a distância entre a realidade do problema e os meios para resolvê-lo? 

Camila - Gostei muito do que o morador fez, na verdade. O vereador a quem ele entregou a água é do mesmo partido do prefeito (PSD) e defende a atuação da concessionária Águas de Itu. O gesto me pareceu tão interessante quanto o das meninas que ergueram um cartaz de "Cadê a Água" ao posar para uma foto com Alckmin (veja o registro aqui). Tenho a maior admiração por quem consegue denunciar a hipocrisia através de um simples gesto. Eu só sei escrever textão.

Por outro lado, é visível o descolamento, mesmo intencional, do governo do estado em relação à crise, especialmente desde o ano passado. O que as suas pesquisas têm indicado sobre isso?

Camila - Ontem mesmo (19/02), a Folha fez a pergunta "O governador Alckmin é culpado pela crise hídrica em São Paulo?" a dois colunistas diferentes, tratando-a como um "tema controverso" que admite respostas diferentes. O mero fato de que o jornal trate a responsabilidade de Alckmin pela crise como um assunto "polêmico" e não como o ponto de partida inevitável para qualquer afirmação subsequente já mostra o quanto estamos distantes de uma discussão séria sobre o assunto.

Você acredita que esta crise sem precedentes pode trazer alguma lição às políticas públicas no país? Ou o "efeito teflon" sobre o governador só atesta que esta pode ser uma expectativa muito distante da realidade?

Camila - Não tenho condições de prever nada: só o que posso fazer, assim como todos os cidadãos, é atuar para que políticas socialmente justas sejam implementadas.


No Ensaio sobre a Cegueira, a visão é recuperada aos poucos por cada um dos sobreviventes da epopeia. Resta saber o que será de nós no momento em que o fim da água, pelo menos na capital, já não é mais uma questão de "se", mas "quando". Aliás, é inevitável imaginar como isso vai acontecer. E como desta vez vamos reagir à falta. A literatura e a história dão spoilers.

Abraços, 
Murilo

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Regular não é censurar!

A mídia e sua regulamentação: a busca de um jornalismo humano e imparcial

por JESSICA LEME*
http://jornalggn.com.br/sites/default/files/u16/democratizar_comunicacoes.jpg
Assunto ácido nos meios jornalísticos e pouco compreendido pela população em geral e que normalmente digere tudo o que a grande massa e o senso comum chamam de “nova censura”, a regulamentação da mídia já existe em diversos países da Europa, assim como no nosso vizinho prodígio Uruguai, que depende só da assinatura do presidente para ser colocada em prática.

A regulamentação dos meios de comunicação nada se assemelha à velha e truculenta censura há não muito tempo usada em nosso país a fim de proibir a liberdade de expressão, seja ela artística ou de cunho jornalístico. O que se pretende é que o Estado regule um dos eixos de maior interesse público, a comunicação. Seja televisiva ou de radiodifusão a intenção não é decidir o que será publicado ou não e sim garantir que o público receba o que lhe é de interesse de forma imparcial visando a informação e não o lucro.

Empresas de comunicação são as que mais lucram em dias atuais. Outra intenção com a regulamentação da mídia é acabar com os possíveis oligopólios e monopólios (que podem transmitir somente informações que lhe interessem, conduzindo às massas a determinada ideia pré-concebida pela empresa). Algumas perguntas podem rodear a cabeça de muitas pessoas, tais como: a mídia quer ser regulamentada? As grandes empresas querem que isso aconteça? Quem ganha? Quem perde? Muitos políticos são donos de concessão de rádio, TV, jornais, e outros meios de comunicação e usam isso a seu favor para diversos fins não sociais. A regulamentação os interessa?

Na Constituição em vigência fala-se sobre a necessidade de regular os meios de comunicação a fim de que promovam o verdadeiro trabalho de informar a população, porém, mais de 25 anos se passaram e nada disso foi discutido abrindo espaço para práticas que em nada contribuem para um jornalismo e comunicação livres de interesses políticos e econômicos. Exemplos:

· Políticos controlam redes de rádio e TVs em seus estados (Desde Getúlio Vargas essa receita de controle das massas funciona como máquinas de votos).

· A mídia particular deve ser equiparada à pública. (Boa parte das rádios comunitárias e canais regionais são engolidos pelos grandes oligopólios que promovem a divulgação somente daquilo que lhes interessa).

· A mídia regional deveria ser estimulada (98% da produção nacional se resumem a SP-RJ).

· A mídia não pode ser controlada por meio de oligopólios (uma única empresa controla 70% da televisão e radiodifusão do país).

Evidente que não temos uma verdadeira mídia democrática. E é essa mesma mídia que através de discursos atravessados impede que esse debate seja levado até o final trazendo as normas tão necessárias para o melhor andamento da comunicação no Brasil. Para os românticos do século XX que ainda acreditam que essa ideia nada mais é que uma manobra para uma Revolução Comunista fica aqui a dica de que busquem saber sobre as normas de regulamentação da mídia nos EUA há muito tempo estabelecida.

Nos EUA é vedada toda forma de oligopólio midiático. Assim como os conteúdos são regulamentados de acordo com a faixa etária, também existem regras para a quantidade e qualidade de sua propaganda. Donos de jornais impressos não podem ter canais de TV, entre outras normas que asseguram uma mídia verdadeira e realmente democrática, como também a livre concorrência.

No Uruguai a lei de regulamentação midiática só precisa da assinatura de José Mujica para então ser aplicada. Nela foram estabelecidas medidas como a de estabelecimento de faixa etária para determinados programas, assim como limites para a transmissão de cenas de violência, também a proibição da criação de oligopólios que ferem a verdadeira democracia, entre outros temas. Assim como no Brasil a oposição julgou as normas como uma nova forma de censurar o trabalho do jornalista. 

Essa discussão é mais que necessária para que num futuro não muito distante possamos ter uma mídia livre e plural, que nossos telejornais não mais atentem a interesses de terceiros bem como usem de seu poder de persuasão para estabelecer políticas e práticas prejudiciais a grande população. Para ilustrar melhor o tema, é recomendado assistir um documentário que explica um pouco mais sobre a formação do domínio midiático aqui, e que foi proibido de ser exibido por um tempo em terras brasileiras, chamado “Muito além do cidadão Kane”. Essa produção britânica foi exibida no Reino Unido em 1993. Seu enfoque é no surgimento, crescimento e domínio das empresas controladas por Roberto Marinho e todo um “lado B” da censura e concessão de direitos midiáticos na ditadura. Vale a pena assistir.

Com o mínimo de crítica a respeito de tudo que é televisionado e transmitido pela rádio, fica claro que determinados temas são mais levados ao “ar”, são por mais tempo debatidos, transmitidos. O Brasil é um país extremamente midiático, somos um dos países do mundo em que as pessoas mais passam tempo em frente às televisões, bem como somos os campeões em rede sociais e tempo na internet. Isso tudo deixa claro o quanto uma mídia tendenciosa pode manipular a opinião pública. Se ela tem o poder de chegar até os locais mais longínquos, bem como o poder de se fazer “entender”, os interesses de seus transmissores não podem estar em conflito com os principais interesses sociais da nação e não atentarem contra a democracia. Esse debate é muito importante, principalmente a partir do momento que a internet está ai para mostrar o outro lado de uma notícia.


* Colaborou Thiago Bohatch: geógrafo e mestrando em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Quem tem moral?

por LETÍCIA SANTOS


Nas últimas semanas, declarações de políticos surpreenderam e causaram asco em parte da população brasileira e em parte do eleitorado itarareense.

Após se tornar público que oito vereadores de Itararé votaram contra um Projeto de Lei encaminhado pelo executivo municipal para incorporação de 348 mil reais para a Saúde e 17 mil reais para a Agricultura, como foi noticiado pelo Desafinado, o vereador Willer tentou justificar sua atitude e a de seus companheiros, afirmando que “tiveram que votar assim”, que a Prefeita teria dito que não precisava de vereadores e, por conta disto, tiveram que fazer sua vontade prevalecer, votando 'não'!

Ou seja, deixou claro que suas desavenças particulares são mais importantes do que seu trabalho político nesta cidade, de beneficiar e ajudar a melhorar a qualidade de vida dos moradores.

Outra declaração que causou repulsa foi a de Eduardo Cunha, Presidente de Câmara de Deputados, que afirmou “Aborto e regulação da mídia só serão votados passando por cima do meu cadáver”.


O que assusta é o posicionamento individualista desses políticos, representantes do povo, mas somente das pessoas que pensam como eles, deixando suas convicções e problemas particulares dominarem seu trabalho. Sandro Chaves, em seu texto “A ameaça do conservadorismo”, explanou muito bem sobre ideologias que costumam ter como base um certo moralismo, falando sobre políticos como Marco Feliciano, Jair Bolsonaro e, inclusive, Eduardo Cunha.

Ignorando os direitos das chamadas minorias, deixando de lado necessidades de toda uma cidade, para fazer prevalecer suas vontades e convicções pessoais, qual seria a justificativa? A moral já foi muito usada para explicar atitudes tirânicas como essas, em nome da “moral e dos bons costumes”, muitas pessoas já tiveram seus direitos reprimidos. Mas o que é moral? A moral de quem deve prevalecer?

O filósofo Friedrich Nietzsche fala sobre a moral como algo que nos é vendido pelos detentores do poder, que jogam seu senso comum no ventilador, e as pessoas reproduzem suas ideias, sem saber que na verdade pensam assim porque alguém quer que pensem assim.

Hans Kelsen, em sua obra Teoria Pura do Direito, fala que do ponto de vista científico, se rejeita o suposto de valores absolutos em geral e de um valor moral absoluto em particular, não há uma moral absoluta, isto é, que seja a única válida, que em diversas épocas, nos diferentes povos, classes e profissões, valem sistemas morais muito diferentes e contraditórios entre si, então afirmação de que as normas sociais devem ter um conteúdo moral, devem ser justas, para poderem ser consideradas como Direito, apenas pode significar que estas normas devem conter algo que seja comum a todos os sistemas de moral, enquanto sistemas de justiça. Contudo, também coloca em sua reflexão a dificuldade em determinar qualquer elemento comum aos conteúdos das diferentes ordens morais, devido à grande diversidade daquilo que os homens efetivamente consideram como bom e mau, justo e injusto, em diferentes épocas e lugares.

Kelsen também fala sobre uma Teoria de valores relativista, que significa que não há valores absolutos, mas apenas valores relativos, que os valores que nós constituímos através dos nossos atos produtores de normas, e pomos na base de nossos juízos de valor, não podem apresentar-se com a pretensão de excluir a possibilidade de valores opostos.

Ou seja, na política o todo existe necessariamente antes da parte. 

Exemplo disto é o presidente do Uruguai, Pepe Mujica. Homem, heterossexual, afirma que nunca fumou maconha na vida, no entanto em seu governo promulgou a legalização do aborto, aprovou o matrimônio igualitário e regulamentou o uso da maconha.

Com isso, quero dizer que pouco importa se um juiz ou um governo gostam ou desgostam de algo. Como sustenta um dos maiores juristas do mundo, Ronald Dwonkin, o direito deve ser aplicado por princípios, e não por política ou por moralismo. O que esses guardiões da própria moralidade devem aprender é que nem tudo é sobre eles. E em nome da moral não é possível superar a Constituição, mesmo que isso me desagrade ou desagrade a outras pessoas.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Vamos falar sobre aborto

por MARIANA BRUNO PINTO*


Eduardo Cunha, atual presidente da câmara dos deputados, fez uma declaração preocupante na última semana. Afirmou que a votação sobre o aborto nesse país será feita apenas sobre o seu cadáver.

No Brasil, ocorrem aproximadamente 1,4 milhões de abortos clandestinos. Os métodos de abortamento são toscos e insalubres e são a causa de 15% das mortes maternas e na maioria dos casos essas mulheres pertencem às classes sociais menos favorecidas. 

Ainda no ano de 2014 o portal G1 noticiou uma mega operação para desmontar uma rede clandestina de abortos em uma zona nobre da cidade do Rio de Janeiro, nessas clinicas teriam ocorrido uma série de abortamentos assistidos por médicos muito bem remunerados. Uma mulher que desejasse interromper uma gestação assistida por um médico deveria desembolsar cerca 7 mil reais para realizar o procedimento.

O aborto seguro, embora ilegal, existe no Brasil, contudo ele é reservado a mulheres pertencentes aos setores privilegiados da sociedade. Mulheres ricas abortam enquanto mulheres pobres morrem nas periferias através de procedimentos rudimentares.

A declaração de um dos chefes do legislativo é aterradora. Enquanto os movimentos sociais bradam pelo direito de escolha da mulher e em defesa da saúde e da vida delas observamos o retrocesso dos nossos representantes políticos em uma questão de saúde publica.

Alguns representantes de doutrinas religiosas e setores conservadores da sociedade apontam as feministas e demais defensoras do aborto como assassinas. Dizem que nós, as feministas, somos pecadoras, imorais, dizem que matamos crianças inocentes. 

Defender a legalização do aborto não significa torná-lo banal. Os países que tornaram o aborto legal, como Uruguai, contam com uma equipe médica composta por psicólogos, assistentes sociais, obstetras. O resultado é a diminuição do numero de abortos, mas, o melhor, o risco de morte, é quase nulo. 

Mulheres não merecem morrer por não sentirem-se preparadas para serem mães, as gestações não deve ser uma imposição biológica, mas sim uma escolha. Nenhuma mulher será obrigada a abortar se suas crenças não permitem ou se pretende levar à gravidez adiante, mas ela deve ter o direito de escolher sem julgamentos, sem estigmas. 

O aborto deve ser debatido. Para que os milhares de mulheres possam escolher.

Vamos falar sobre aborto.


* Mariana Bruno Pinto é bacharel e mestranda em História pela Universidade Estadual do Paraná. Tem experiência na área de História, atuando principalmente nos seguintes temas: música, história do samba, malandragem e cotidiano, identidade. Atua como professora de História na rede pública de ensino.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

O mofo libertador das nossas bibliotecas

Como a linguística e a literatura desmistificam alguns minúsculos pensamentos de Itararé

por LUISA DE QUADROS COQUEMALA


Ferdinand de Saussure é considerado o pai da Linguística e, portanto, uma leitura imprescindível a quem deseja entender um pouco do que é a linguagem. Bem, resumidamente, ele tratava a língua como um organismo que está em constante mudança. Estas alterações acontecem de maneira arbitrária – não tem como prever como será a língua em 100 anos, assim como os romanos não sabiam o que seria do latim. A língua, portanto, muda de acordo com a evolução da sociedade como um todo. Conclui-se, então, que um indivíduo sozinho, por vontade própria, não muda nada na língua.

Em um país, temos, na maneira coloquial (ou popular) de se expressar, os chamados sotaques e gírias. Mas, é necessário também conhecer a língua na sua forma culta, “fixa”, nem que seja apenas para usá-la em ocasiões cerimoniosas. A norma culta é uma maneira de a língua “se manter” frente às suas variações, uma forma comum de utilização – e daí a importância de ter domínio sobre ela. Assim, não existem “donos” da língua, mas apenas aqueles que sabem e que não sabem usá-la de maneira adequada nas mais diversas situações. Itararé é, provavelmente, um dos poucos municípios onde alguns meios de comunicação condenam os que incentivam o uso correto do português – o que, a priori, deveria ser algo básico para quem se propõe a publicar textos regularmente para a população em geral. 

Tal fato não é pedantismo, mas a norma. E é no mínimo contraditório que pessoas que pregam o cumprimento de leis insistam em não obedecer às regras da própria língua e, pior, alegar que cumprir tais regras seria algo injusto, zombeteiro para com a população. No fundo, não passa de um grande jogo onde se cumpre somente aquilo que traz benefícios – nossa gramática é apenas mais um exemplo disso. 

E, acreditem, vim aqui falar de literatura. Mas, onde é que os escritores, os poetas, entram no meio deste assunto? Já dizia Ezra Pound que os artistas são “as antenas da raça”. De fato, os artistas têm a capacidade de detectar problemas sociais e expô-los com sensibilidade, despertando nossa capacidade de reflexão através de outras perspectivas. Alguns pintam telas, outros compõem músicas. Os escritores transmitem aquilo que captam por meio das palavras. Eles não só trabalham com a linguagem, eles trabalham a linguagem: andam junto com a língua, brincam com ela, a tornam mais flexível e ampla. 

Alguns destes artistas se apropriam das palavras de maneira magistral. Como não se emocionar, por exemplo, com os belos versos de Drummond: 

“Deus me deu um amor nos tempos de madureza,
quando os frutos ou não são colhidos ou sabem a verme.
Deus, ou foi talvez o diabo, deu-me este amor maduro
e a um e outro agradeço, pois que tenho um amor.”

Mas, extrapolam-se as belas construções. Os prosadores, os poetas, além de embelezar e inovar, também podem colaborar na formação e desenvolvimento de uma língua. Quem diz “so-so” ou “in a pickle” em inglês, deve isto a Shakespeare. Além disso, o que seria do italiano sem o toscano de Dante, o português sem as construções de Camões – o marco entre o arcaico e o moderno? E são apenas alguns exemplos. O que todos eles escreveram há séculos foi essencial para que suas línguas se tornassem o que são hoje, principalmente porque eles queriam, segundo Erich Auerbach, “enriquecer, ornar e afeiçoar [a respectiva língua], para que fosse tão bela e tão adequada à manifestação de altos pensamentos e de sentimentos elevados quanto o haviam sido as línguas antigas”. Assim, as línguas foram e continuam sendo desenvolvidas pelo constante trabalho dos escritores. 

Partindo disto, é de se estranhar a afirmação recentemente estampada num dos meios de comunicação da nossa cidade: “os grandes escritores tem por trás de seus livros, grandes revisores. É a regra literária!” (sic). Deixando para trás o crasso erro de português da citação, gostaria que o seu autor explicasse a frase. Questiono-a fortemente. Se os grandes escritores tivessem, necessariamente, grandes revisores por trás de si, seriam impossíveis as inovações, a literatura tornar-se-ia rígida. Partindo daí, já poderíamos deixar de lado os brilhantes neologismos de Guimarães Rosa. Afinal, como revisar uma invenção? E, digo mais, acredito que o caminho tenda justamente para o lado oposto. É só fazer o teste: qualquer gramática da nossa língua usa textos literários para exemplificação; por sua vez, os autores literários não se pautam necessariamente e exclusivamente em gramáticas nos seus trabalhos. 

Dizer que tal mentira é a “regra literária” torna tudo ainda pior para seu autor. A literatura pertence ao campo das humanidades. Querer atribuir uma regra imutável e constante para isso é transformar esse maravilhoso campo de estudo em algo exato. Tal atitude beira as raias do ditatorial. Mas, assassinar matérias básicas já se tornou algo comum no nosso município. Fazem questão de mutilar a história e o português e, agora, também querem levar a literatura para o túmulo. Pobres de nós. 

Mas, os autores desses meios rasos de comunicação conseguem se superar: acusam pessoas que estudam e que dedicam seu tempo ao saber de cair “no ninho com o mofo das suas bibliotecas”. Hoje vim, aqui, em defesa da literatura. Mais: vim em defesa daqueles que passam seu tempo lendo, estudando e pesquisando; que encontram no saber o seu conforto diante das injustiças do mundo. E não me refiro só aos escritores deste blog. Refiro-me a Dante, exilado e descrente; a Edmond Dantès, que encontra a liberdade na prisão injusta; a Thomas Mann, ao redigir seu Doutor Fausto. 

No meio do caminho das nossas vidas, nos encontramos em uma selva escura de sofismas e falácia - onde o que resta é dar voz ao conhecimento esclarecido dos silenciosos livros. E é por isso que digo que prefiro cair honradamente com o “mofo da minha biblioteca” a me afundar numa ignorância cilíndrica.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Gravação de Willer tira dúvida sobre motivação do veto à Saúde

"Quero ver se ela vai governar sem vereador", justificou o vereador Willer Costa Mendes na sessão de segunda-feira. Confira o discurso na íntegra


Foto: Folha do Vale
Apesar de todos os rumores envolvendo a motivação dos vereadores que surpreenderam a população de Itararé com votação contrária a Projeto de Lei encaminhado pelo executivo municipal para incorporação de R$ 348 mil para Saúde e R$ 17 mil para Agricultura no orçamento, mediante recursos conquistados junto ao governo do estado de São Paulo via emendas parlamentares, gravação em áudio registrou na íntegra desafio do vereador Willer à prefeita Cristina Ghizzi.

"É triste a gente ter que votar assim, mas, como ela própria chefe do executivo disse, ela não depende de vereador. Eu não lembro bem as palavras que ela disse, mas 'que a maioria que faça valer', é mais ou menos por aí. Que nós não temos maioria, tudo. Então eu vou votar 'não', e vamos ver até quando ela vai ficar sem respeito. Vamos ver se ela vai respeitar o vereador ou não. Qual que é o modo de a gente fazer prevalecer? É votar 'não'! Quero ver se ela vai governar sem vereador. Ela disse que não precisa de vereador. Inclusive ela disse que se o vereador ficou de joelho lá o Zetão pode passar pra outro lado, foi mais ou menos por aí. Então eu vou votar 'não'. Obrigado, senhor presidente." (Willer Costa Mendes)